Brasília - Crimes de abuso sexual contra crianças e adolescentes não têm endereço certo e ocorrem em diversos setores da sociedade. Pobres e ricos são vítimas dessa forma de violência.
“O abuso sexual no Brasil reza missa, dirige culto, é doutor, tem mandato e disputa eleição. Está nos tribunais, no conselho tutelar e na creche. Mora em condomínios, mas também está desempregado. Bebe uísque e cachaça. É a própria cara da sociedade abusando das nossas crianças”, diz o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia, senador Magno Malta (PR-ES).
Entretanto, segundo a coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), Leila Paiva, quem costuma fazer denúncia de abuso sexual são pessoas das camadas mais pobres.
“A violência sexual não é uma violência de classe. Mas a violência que chega à esfera pública é uma violência de classe”, explica Leila, que também é responsável pelo serviço Disque 100, que recebe denúncias de violências contra crianças e adolescentes. “As classes A e B também têm vítimas, mas não denunciam”, destaca a coordenadora.
A psicóloga Karen Michel Esber, autora do livro Autores de Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, alerta para o fato de que os números oficiais não representam o total de casos.
“No silêncio dos muros das casas das classes A e B, ninguém fica sabendo. A denúncia não acontece por medo ou por vergonha. Há mulheres que pensam 'o que eu vou fazer sem esse marido?'. Nas classes populares, há mais visibilidade e a vizinha denuncia para o conselho tutelar.”
A titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) de Brasília, Gláucia Cristina Ésper, confirma que os mais pobres denunciam mais do que as pessoas de classe média ou alta.
“O sexo é um tabu. Quem que as pessoas carentes têm para procurar ajuda? Correm para a porta da polícia. As pessoas com poder aquisitivo maior não querem registrar ocorrência.”
Gláucia Ésper destaca a importância de que as pessoas mais pobres tenham acesso a canais de denúncias na própria comunidade. Ela cita o exemplo da DPCA de Ceilândia, cidade a 30 quilômetros de Brasília, que recebe um grande número de registros de abuso.
“A pessoa carente, às vezes sem dinheiro para comer, vai pagar um ou dois ônibus para chegar à Asa Norte [área central de Brasília] para registrar uma ocorrência?"
Para a delegada, a presença e proximidade do Estado nas comunidades mais pobres é fundamental. “A delegacia estando mais próxima, as pessoas procuram mais."
Nenhum comentário:
Postar um comentário