- Tiago Queiroz/Estadão ConteúdoCarlos de Almeida, 50, morador de Igaratá (SP), exibe uma foto da antiga cidade, inundada desde março de 1969
A seca que atinge o rio Jaguari fez reaparecer as ruínas de uma cidade
que estava submersa desde março de 1969, quando começou a construção dos
reservatórios usados na geração de energia para a região do Vale do
Paraíba e do Sistema Cantareira.
No fundo de uma represa, que
está 30 metros abaixo do nível normal, entre Joanópolis e São José dos
Campos, no interior paulista, a igreja matriz, a praça e a rua principal
da Igaratá Velha ressurgiram e se transformaram em ponto turístico.
Os 2 mil moradores do antigo povoado de Igaratá Velha, formado em
meados de 1865 em uma confluência dos Rios Jaguari e do Peixe, foram
removidos para uma nova cidade homônima um século depois. Criada em
dezembro de 1969 a 3 quilômetros da antiga cidade, a nova Igaratá nasceu
em um terreno da antiga Centrais Elétricas de São Paulo (Cesp), doado
aos moradores. Hoje, o município tem cerca de 9 mil habitantes.
O
reaparecimento das ruínas da Igreja Nossa Senhora do Patrocínio
emociona quem viveu no antigo povoado. Um grupo colocou uma nova cruz
onde ficava a igreja. "O pessoal mais velho vem e passa o domingo
rezando em volta da cruz. Não querem que a água cubra de volta a
igreja", diz o agricultor Edilson Cardoso, de 32 anos.
Com um
quadro da Igaratá Velha debaixo dos braços, o pescador José Carlos de
Almeida, de 50 anos, cobra R$ 5 para levar turistas de canoa até as
ruínas do antigo grupo escolar, no meio da represa. "Se a represa baixar
os 10 metros que faltam, vai reaparecer a cidade inteira."
A
prefeitura de Igaratá também fez melhorias na pista de terra que dá
acesso às ruínas, para facilitar a visitação. "Uma pena não ter dinheiro
para fazer a preservação das peças encontradas. Muita coisa as pessoas
já levaram embora", diz o secretário de Obras de Igaratá, Emerson
Rodrigues, de 35 anos.
Enchentes
Na época da remoção
promovida pela Cesp, a maior parte dos moradores concordava com a
mudança. "Era muita enchente. No período das chuvas todo mundo tinha de
sair de casa. Só os mais antigos não queriam mudar", recorda José
Rodrigues, de 72 anos.
Na nova Igaratá, a emoção pelo
ressurgimento da antiga igreja parece ter anestesiado a preocupação com a
seca. Mesmo entre os mais jovens a curiosidade é grande. Muitos querem
descobrir onde ficava a casa da avó, da tia que morreu, do prefeito.
Telhas dos anos 1940, escadarias, tanques de lavar roupa e restos das
cadeiras da praça podem ser observados sobre o solo seco. No meio da
represa estão estacas das casas demolidas na época da inundação.
"Toda semana aparece uma coisa nova. Muito velhinho vem aqui e se
emociona, chora mesmo", conta Fabio Saltonato, de 28 anos. "Quero achar a
casa que era do meu pai. Pelo que vi nas fotos, se baixar mais 2 metros
ela vai aparecer. Quem sabe depois do carnaval."
Mas a seca
derrubou o turismo, principal atividade econômica de Igaratá. Na beira
da represa, dezenas de chácaras e sítios de veraneio estão à venda.
Pontos que funcionavam como marinas estão vazios. "Com essa transposição
de água da represa, a cidade vai 'morrer' economicamente. Esse é nosso
medo", diz o secretário de Obras.
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