sábado, 11 de abril de 2015

Quase 400 crianças foram vítimas de violência sexual no RN apenas em 2014

Apesar do alto número, delegacia especializada não tem estrutura para atender toda a demanda do RN

Foto: José Aldenir
Diego Hervani
Repórter/JH
Foto: José Aldenir
O governo já deixou claro que a segurança pública é uma das principais preocupações atuais no Rio Grande do Norte. As recentes rebeliões e a fuga de mais de 32 detentos em Alcaçuz aumentou ainda mais a apreensão. Entretanto, dados divulgados em um livro publicado pelo coordenador de Informática e Estatísticas da Secretaria de Segurança Pública (Sesed), Ivenio Hermes, mostram que é necessário um olhar mais atento aos crimes contra crianças e adolescentes. Apenas em 2014, 404 casos de violência contra menores de 12 anos foram registrados no RN.
Desses 404 casos contra crianças, 398 foram registrados como violência sexual, podendo se incluir abusos, estupros e exploração. Quando se soma os crimes ocorridos com crianças e adolescentes esse número sobe para 459. Uma das informações que mais chama atenção é que desses 459, 196 foram cometidos por pessoas que fazem parte da família da vítima. Os padrastos aparecem na liderança, responsáveis por 17% dos crimes (71 casos), seguidos pelos pais, com 15% (62 casos). Os tios representam 7% (28 casos) e os avôs 3% (10 casos). Dividindo por faixa etária, crianças entre 8 e 11 anos são as maiores vítimas, com 148 casos. A sequência é a seguinte: dos 12 a 14, 145 casos; de 4 a 7, 97 casos; dos 15 aos 18, 50 casos; e de 0 a 3, 19 casos.
A titular da Delegacia Especializada na Defesa de Crianças e Adolescentes (DCA), Rossana Pinheiro, disse que os números “reais” são bem maiores do que esse. Segundo ela, um dos motivos para que as estatísticas não sejam maiores é que a estrutura da DCA está longe da ideal. “Para se ter uma ideia, quando a delegacia foi criada, em 2001, ela tinha uma equipe de 18 pessoas, contando com o delegado e o escrivão. 14 anos de passaram e a demanda aumentou. Ao invés do efetivo aumentar, ele acabou diminuindo. Hoje temos uma equipe de apenas oito pessoas trabalham na delegacia”.
A falta de pessoa fez com que a delegada tomasse uma decisão. A DCA passaria a atender apenas casos de Natal e Região Metropolitana. “Na lei não existe nada que proíba outras delegacias de investigar os casos de agressões contra crianças e adolescentes. Falamos com o nosso chefe e mostramos que não tínhamos condições de atender todo o Rio Grande do Norte, que era a ideia inicial quando a DCA foi criada. Estamos com oito pessoas na equipe, se acontecesse um caso na região Oeste, teríamos que enviar metade da equipe para lá e aqui ficaria descoberto”.
Outro fator que atrapalha o trabalho da DCA é a subnotificação. O número de pessoas que não denunciam agressões contra crianças e adolescentes é muito grande. Com isso, delegada Rossana conta que tem feito alguns trabalhos sociais para tentar reverter a situação. “Existem estatísticas que apontam que os casos denunciados de violência sexual representam apenas 10% do que realmente acontece. Nós estamos sempre participando de projetos e conversando com os menores”.
A intenção, segundo Rossana, é fazer com que esses menores percebam que estão sofrendo violência sexual. “Os agressores se aproveitam da inocência dessas crianças para abusarem delas. Ao conversar com esses menores, nós mostramos como esses abusos acontecem para que eles identifiquem quando estiveram sofrendo a mesma coisa. Depois, falamos para que eles procurem alguém de confiança para denunciar, seja um vizinho ou parente. Elas também podem procurar diretamente a polícia”.
Um dos canais mais usados pela DCA é o chamado “Disque 100″, que foi criado exatamente para servir de canal da delegacia com as vítimas de violência sexual. “Pelo Disque 100, o atendente vai anotar tudo o que for dito, independentemente se a denúncia estiver sendo feita por um adulto ou criança. Eles anotam e nos encaminham”, afirmou Rossana, que ainda lembrou da importância dos profissionais da saúde e educação no combate aos crimes contra crianças e adolescentes. “Os profissionais da saúde, quando alguma criança chega no hospital com algum indicativo de violência, seja sexual ou não, têm a obrigação de notificar as autoridades. A mesmo coisa serve para os educadores, como os professores”.
As estatísticas também trazem a divisão por regiões de Natal, que é o município com o maior número de ocorrências. Apenas a Zona Norte foi responsável por 40% dos casos (159 ocorrências). A Zona Oeste com 28% (110 ocorrências), Zona Leste com 17% (65 ocorrências) e Zona Sul com 15% (59 ocorrências), completam o ranking. Para Rossana, entretanto, esses números não significam necessariamente que as classes mais “ricas” apresentam uma menor quantidade de violência contra menores.
“O problema é que as classes que têm um recurso financeiro maior, geralmente tentam esconder a situação. Muitas dessas famílias não notificam os casos para a delegacia, elas preferem outro meios, como tratamentos médicos. Parece que elas acreditam que aquela situação pode arranhar a imagem familiar. Já as famílias de um poder aquisitivo menor, normalmente têm uma maior facilidade e disposição para falar com as autoridades e denunciar o que está acontecendo”.

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