Mosquitos silvestres têm potencial para transmitir vírus
O vírus da chikungunya pode sair das cidades para as matas
brasileiras, tornando-se silvestre e impossibilitando a erradicação da
doença no país. O alerta é de cientistas dos institutos Oswaldo Cruz e
Pasteur, na França, que tiveram artigo publicado na revista científica
internacional PLOS Neglected Tropical Diseases.
O documento foi divulgado nesta semana pela Fundação Oswaldo Cruz, no
Rio. O processo é semelhante ao da febre amarela, doença de origem
africana que se tornou endêmica no Brasil e, de tempos em tempos,
espalha-se das matas para áreas urbanas.
Na pesquisa coordenada pela Fiocruz, os cientistas constataram que mosquitos silvestres como o Haemagogus leucocelaenus e a Aedes terrens, comuns na América do Sul, são capazes de transmitir o vírus da chikungunya entre três e sete dias, o que significa alto potencial de disseminação.
Hoje, tanto a chikungunya, também de origem africana, como a febre amarela são transmitidas no Brasil pelo mosquito Aedes aegypti. As duas doenças provocam febres e fortes dores pelo corpo.
Nas cidades, o transmissor da chikungunya é o mosquito Aedes aegypti,
que se infecta picando uma pessoa doente e transmitindo para outras
pessoas. Na floresta africana, onde foi identificada, os mosquitos
silvestres contraem o vírus picando macacos doentes. A infecção humana
só ocorre por acidente, quando uma pessoa é picada na mata.
Segundo o chefe do Laboratório de Mosquitos Transmissores de
Hematozoários do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) e coordenador do estudo,
Ricardo Lourenço de Oliveira, o avanço para áreas silvestres torna o
vírus mais difícil de ser enfrentado, podendo levar ao aumento no número
de casos. “Esse cenário apresentaria um grave problema de saúde
pública, uma vez que a infecção se tornaria mais difícil de controlar”,
afirma. Nas florestas, o combate ao mosquito é impossível.
Para os cientistas, é necessário começar, o quanto antes, o
monitoramento de regiões em áreas de mata. “É fundamental incorporar o chikungunya em
uma rotina de vigilância no ambiente silvestre”, diz Lourenço. Isso
inclui a verificação de mosquitos e de macacos para avaliar se a
transmissão já está ocorrendo próximo a florestas e monitorar esta
possibilidade.
Interiorização
Com a febre amarela, o percurso do vírus foi da cidade para as
florestas. Trazidas para as Américas, a doença primeiro circulou em
áreas urbanas, provocando epidemias, depois, próximo de matas. Com as
campanhas de combate ao Aedes, no entanto, os episódios diminuíram.
Nas regiões de floresta, a vacinação se tornou a única forma e
prevenir os casos de febre amarela, segundo a Fiocruz, apesar de
inúmeros problemas de cobertura. Os cientistas lembram, no entanto, que
ainda não foi descoberta vacina para a chikungunya.
Dados do Ministério da Saúde mostram que, no Rio, estado com o maior
número de casos do país, o registro é duas vezes maior do que o de
dengue. As 6,7 mil ocorrências em 2019 representam uma alta de 14%
diante das 5,8 mil em 2018. Altos índices de notificações também foram
observados em Tocantins, no Pará e no Acre.
Para prevenir a migração da chikungunya, os cientistas
querem mais estudos. Os mosquitos silvestres, explicam, não se
desenvolvem bem em laboratório, justamente por serem selvagens. Também
não ficou comprovado que macacos conseguem hospedar o vírus.
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