sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Três tipos de vacinas contra zika têm resultados positivos em primatas

Um grupo de cientistas brasileiros e americanos completou mais uma etapa dos estudos pré-clínicos para o desenvolvimento de vacinas contra o vírus da zika. Um mês depois de anunciar que duas candidatas a vacinas deram proteção completa a camundongos, o grupo comprovou em novo estudo que três tipos de vacinas foram totalmente eficazes contra a infecção por zika em macacos rhesus.
O novo estudo, que teve seus resultados publicados nesta quinta-feira, 4, na revista Science, foi feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), do Beth Israel Deaconess Medical Center (BIDMC, na sigla em inglês) e do Instituto de Pesquisas Walter Reed do Exército (WRAIR), ambos dos Estados Unidos.
"As três vacinas forneceram proteção completa contra o vírus da zika em primatas não humanos, que são o melhor modelo animal para estudos antes de iniciar os testes clínicos (em humanos)", disse um dos autores do estudo, Dan Barouch, diretor Centro de Pesquisa em Virologia e Vacinas do BIDMC e professor da Escola de Medicina da Universidade de Harvard.
"A proteção robusta e consistente contra o vírus da zika em roedores e primatas nos deixa otimistas em relação ao desenvolvimento de uma vacina segura e eficaz contra a zika para humanos", afirmou Barouch.
Nesta quarta, o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, anunciou o início dos testes em humanos de uma vacina experimental de DNA contra o vírus da zika.
Em junho, as autoridades de saúde americanas já haviam aprovado a realização de testes clínicos em humanos para uma outra candidata a vacina contra a zika, produzida pelo laboratório americano Inovio, em parceria com a GeneOne Life Sciences, da Coreia do Sul. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), há mais de 20 projetos de vacina contra o vírus da zika em países como os Estados Unidos, Brasil, Índia, França e Áustria.
O novo estudo teve a participação de dois cientistas ligados à Rede Zika - uma força-tarefa criada por cientistas paulistas para combater a epidemia -, Paolo Zanotto e Jean Pierre Peron, ambos pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP). 
Segundo Zanotto, os vários estudos simultâneos que estão sendo realizados por vários grupos diferentes contribuem para acelerar o desenvolvimento de uma vacina contra a zika. "Todos estão aprendendo com todos. Estamos em uma situação onde se tem um esforço que, à primeira vista, pode parecer competitivo. Mas na verdade trata-se de um esforço coletivo que promove o que chamamos de 'efeito de redundância'. Todo sistema é mais robusto quando há redundância. Em vez de cada laboratório tentar avançar de forma linear, os avanços estão sendo processados em paralelo. Isso sem dúvida vai acelerar o desenvolvimento da vacina", disse Zanotto ao Estado.
O novo estudo, segundo Zanotto, é uma prova de conceito, em fase pré-clínica (com animais) que deverá ajudar todos os outros grupos que estão investigando vacinas a passar para a fase 1 dos estudos clínicos (com humanos). "Temos um risco mundial e a comunidade científica tem pressa para desenvolver essa vacina. Na USP, temos sete laboratórios trabalhando como se não houvessem portas entre eles. Isso também está acontecendo em nível mundial, com um efeito positivo em escala planetária", afirmou Zanotto.
De acordo com o cientista, muitos dos trabalhos de vários grupos se beneficiaram, por exemplo, das pesquisas feitas pelo Instituto Evandro Chagas, sob a liderança de Pedro Vasconcelos, que isolou a linhagem brasileira do vírus da zika. "Nossos trabalhos na Science e na Nature não teriam sido possíveis sem a generosidade do Pedro Vasconcelos, assim como vários dos trabalhos de outros grupos internacionais. Vivemos uma nova realidade de atuação e os cientistas têm consciência das graves consequências sociais que enfrentaríamos caso nos comportássemos agora de maneira egoísta", disse Zanotto.
Algo semelhante aconteceu durante o surto de Ebola da África em 2014 e 2015, segundo ele. "Estamos vendo essa mentalidade se fortalecer. Antes de publicar nas revistas científicas indexadas, todos estão compartilhando seus trabalhos imediatamente em plataformas de livre acesso. Isso acelera muito os trabalhos", explicou.
Testes em macacos. O funcionamento das vacinas consiste em estimular o sistema imune do paciente para que ele desenvolva defesas contra o vírus. No novo estudo, publicado na Science, os cientistas testaram três maneiras de produzir a imunidade em macacos rhesus: uma vacina de vírus inativo purificado (PIV, na sigla em inglês), desenvolvida por cientistas do exército, uma vacina de DNA e uma vacina com base em vetor de adenovírus. As três apresentaram eficácia notável sem nenhum efeito adverso, segundo os autores.
Para testar a vacina PIV, os cientistas imunizaram oito macacos rhesus com o vírus inativo e oito outros macacos com um placebo. Em duas semanas, os sistemas imunes dos animais produziram anticorpos contra o vírus.
Depois de uma nova aplicação após quatro semanas, os níveis de anticorpos subiram substancialmente, segundo os cientistas. Quando os macacos foram expostos a duas linhagens diferentes do vírus da zika, isoladas no Brasil e em Porto Rico, mostraram que estavam completamente protegidos contra a zika, sem nenhum vestígio detectável do vírus no sangue, nem nos fluidos corporais.
Em um segundo experimento, 12 macacos rhesus foram imunizados com as vacinas de DNA ou com a vacina com base em vetor de adenovírus. Esses dois tipos de vacinas introduzem apenas um fragmento do DNA do vírus, que codifica proteínas da membrana que o envolve, fazendo com que o sistema imune do paciente desenvolva anticorpos.
Nesse experimento, ambas as vacinas produziram anticorpos específicos contra o zika em todos os macacos testados. A vacina com base em vetor de adenovírus provocou uma resposta mais ampla e potente. Quando os primatas foram expostos à linhagem brasileira do vírus da zika, ambas as vacinas forneceram proteção completa. Os dados sugerem que os testes clínicos para essas candidatas a vacinas contra o zika podem acontecer mais rápido do que se pensava. 


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