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Os médicos do Serviço de Neurologia do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL), além da subcoordenadora de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde (Sesap), Juliana Araújo, esclareceram em coletiva de imprensa realizada ontem pela manhã, que dois pacientes internados com uma doença degenerativa, não são portadores do "mal da vaca louca". Apesar de apresentarem sintomas comuns à moléstia desenvolvida nos animais, como a degeneração cerebral e motora, os pacientes desenvolveram a variante conhecida Doença Creutzfedt-Jakob (vDCJ), ou simplesmente doença priônica. Ela é causada por uma alteração na proteína príon e ataca o sistema nervoso central.
alberto leandroEquipe médica que atende pacientes no HUOL concederam entrevista na manhã de ontem para esclarecer casos atendidos
Um potiguar de 42 anos e uma carioca de 31 anos, deram entrada no complexo hospitalar com quadro de demência e contração muscular. Após exames realizados pela equipe de neurologistas formada pelos médicos João Rabelo, Clécio Godeiro Júnior, Mário Emílio e Carlos Eduardo, constatou-se a suspeita de uma variação da DCJ, diferente daquela que dizimou rebanhos bovinos na Inglaterra nas décadas de 80 e 90. No início dos anos 2000, alguns casos em animais foram notificados na Europa, mas em menor proporção.
Desde 1998, o Governo Brasileiro proibiu a importação de derivados de sangue humano doados por pessoas residentes no Reino Unido, além da importação de carne bovina e produtos derivados, com o objetivo de impedir que o mal chegasse ao país. A moléstia ataca, principalmente, as células nervosas causando degeneração cerebral e, consequentemente, perda da memória, dos movimentos musculares até chegar ao óbito.
Contato
O chefe do Serviço de Neurologia do HUOL, João Rabelo, esclareceu que para terem contraído o "mal da vaca louca", os pacientes deveriam ter tido contato com a fonte causadora da doença, o que não ocorreu. "Os pacientes desenvolveram a doença de forma esporádica. Eles não consumiram carne importada, não receberam transfusão de sangue ou foram transplantados", afirmou João Rabelo. A vDJC é considerada rara e a incidência é de um caso a cada um milhão de habitantes.
No Rio Grande do Norte, de 2006 até hoje, seis pessoas apresentarem sintomas similares. Nenhum dos casos, entretanto, foi confirmado após a morte dos portadores. Por isso, os médicos não afirmaram se o índice é considerado alto ou não. "Nós acompanhamos o caso de um senhor do interior, mas não realizamos a análise do tecido cerebral após sua morte. Este é um procedimento que deve ser feito para que tenhamos certeza de que a vDCJ foi a causadora da morte", defendeu Clécio Godeiro Júnior.
Os pacientes internados no HUOL, segundo análise da equipe de neurologistas, se encaixam no índice de 85% que desenvolvem a doença de forma esporádica. Ou seja, não existe uma fonte infecciosa conhecida, nem evidência da doença na história familiar do paciente. Entre 10% e 15% dos portadores da doença priônica herdaram a moléstia de algum familiar. Sendo, portanto, casos hereditários. Consequência de uma mutação no gene que codifica a produção da proteína priônica.
O tratamento dos pacientes que se encontram no Hospital Universitário Onofre Lopes, segundo João Rabelo, é similar à atenção dispensada aos acometidos pela hepatite. "Não há um tratamento específico, por se tratar de uma doença degenerativa. Inclusive encaminhamos o paciente para casa, onde ele pode ficar ao lado da família", afirmou. O diretor-geral do HUOL, Ricardo Lagreca, reiterou que a população pode ficar tranquila. "Não há motivos para desespero. Já ocorreram casos similares e tudo ficou sob controle", afirmou o diretor.
Proteína se multiplica e mata células
De acordo com o geneticista João Neri, o príon é uma proteína que tem capacidade enzimática autônoma. "A proteína se acumula, principalmente, dentro das células nervosas. Com o passar do tempo, se acumulam de uma maneira que levam a célula à morte", esclareceu. O resultado da morte das células nervosas é justamente a demência, a perda dos movimentos musculares apresentadas pelos pacientes internados no HUOL.
"É uma alteração que não tem como medicar. As células nervosas ficam "blindadas" através de uma barreira macroencefálica. A medicação, portanto, não consegue interromper a ação do príon", destacou João Neri.
Ele afirmou, ainda, que os casos são raros no Brasil e alguns portadores podem iniciar o processo de desenvolvimento da doença ainda na infância. "Por se tratar de uma doença crônica, pode ocorrer que os sintomas só apareçam anos depois do início da ação da proteína nas células".
Desde 1980, casos suspeitos são registrados no Brasil
De acordo com levantamento do Ministério da Saúde, entre 1980 e 1999, foram registrados 105 mortes cuja suspeita recai sobre o vDCJ no Brasil. Entretanto, não foram confirmadas oficialmente. Os primeiros casos da vDCJ foram notificados na Alemanha, em 1920.
A vDCJ já foi identificada em diversos países, principalmente os europeus como a França, Reino Unido, Alemanha, Espanha, Itália, Austrália, Holanda, Estados Unidos e Japão. Entre os países estudados, o Brasil aparece como o de menor índice de mortes cujas suspeitas recaem sobre o vDCJ.
Nos países europeus citados, além dos Estados Unidos, Austrália e Japão, no período de 1993 a 2000, foram notificados de 2.199 casos da forma denominada esporádica.
Esta forma ocorre quando não existe uma fonte infecciosa conhecida nem evidência da doença na história familiar do paciente.
Já nos Estados Unidos, a vigilância para vDCJ, realizada pela análise de dados de mortalidade, registrou, no período de 1979 a 1998, um total de 4.751 óbitos pela doença.
TN
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