segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Para onde vão os lençóis hospitalares sujos de sangue

A reportagem do Diário de Natal lançou-se ao desafio de averiguar, em um grande hospital do Rio Grande do Norte, o uso, reutilização e destino final de panos utilizados em uma unidade de saúde com centro cirúrgico. A ideia era verificar os procedimentos adotados para higienizar o material, e tentar descobrir de que forma, nos Estados Unidos ou em qualquer outra parte do mundo, materiais com manchas de sangue humano poderiam ir parar no lixo comum - e dele serem retirados e colocados em forros de bolsos de calças.



Fábrica em Pernambuco comprava material para fazer forros de bolsos Foto:Bernardo Dantas/DP/D.A Press

A existência de uma máfia do lixo hospitalar foi detonada no último dia 14 em Pernambuco, após apreensão de 46 toneladas de lixo hospitalar vindos dos Estados Unidos no Porto de Suape (PE). O escândalo começou a vir à tona quando foi descoberto que lençóis de hospitais - lixo hospitalar - eram utilizados na produção de forros de bolsos revendidos a indústrias brasileiras. Além do material apreendido em Suape, também foram descobertos depósitos daempresa Império do Forro de Bolso, em Toritama, Santa Cruz do Capibaribe e Caruaru, no agreste pernambucano. As autoridades investigam agora o que ocorria com o material antes de sair do lixo para as camas e calças dos consumidores brasileiros. Sabe-se até agora que os lençóis são oriundos de grandes hospitais norte-americanos e até de alguns brasileiros.

O percurso proposto pelo DN foi tentado em vários hospitais, públicos e privados, mas os únicos a prestarem informações sobre o assunto o Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) e a Casa de Saúde São Lucas, um dos maiores hospitais privados do Rio Grande do Norte. Neste último, o consumo mensal e lavagem de peças de roupa e lençóis, nos 140 leitos e sete salas do centro cirúrgico da unidade particular, conforme informou o diretor Sidney Gurgel, é de 5.294 lençóis, 2.802 fronhas, 383 batas e 253 jalecos. O material tem diversos fornecedores e o tempo médio de uso é de seis meses. Depois disso, são incinerados.

No Hospital Onofre Lopes, uma instituição federal administrada pela UFRN, o rejeito não tem o mesmo fim. Vai para o lixo comum, mas apenas depois de uma rigorosa desinfecção, com lavagem e esterilização. A quantidade de rejeito é muito pequena. Não chega a 2 quilos por mês, em geral em retalhos. Todo o resto e usado e reutilizado nas dependências do hospital, referência em atendimentos de alta complexidade.

A reportagem solicitou acesso à lavanderia do HUOL. Por receio de associar a imagem do hospital aos eventos recém-descobertos pelas autoridades pernambucanas, não foram permitidas fotografias no setor denominado "Área Contaminada", onde os lençóis (com logomarca do HUOL) chegam para lavagem, então sujos de sangue e outras secreções humanas, em geral oriundos do centro cirúrgico do hospital. Ainda assim, a equipe teve acesso a todo o processo de limpeza, inclusive nesse setor. A reportagem também observou como é feita a distribuição do material - devidamente esterilizado e limpo, saliente-se.

Compra e distribuição

O material utilizado pelo HUOL é comprado por duas empresas: a Ecilatex, de Brasília (DF) e a Maringá, de João Pessoa (PB) - vencedoras do processo de licitação para o serviço. 26 pessoas são as responsáveis por lidar com esse tipo de material. Todas trabalham no Serviço de Processamento de Roupas (SPR). "Seguimos todas as regras da RDC 360, de 2004, conforme determina a Anvisa", explica a gerente do setor, Jussiene Bezerra da Silva Santos, referindo-se às normas que regem o uso de tecidos hospitalares. A gerente explica que a produção de roupas de um hospital é diferenciada da caseira, pois é preciso atender às exigências da Anvisa. A composição do tecido, a sua espessura e qualidade são algumas dessas exigências. "A tradução do cuidado com o material utilizado se reflete no conforto dado ao paciente", destaca ela.

Jussiene acompanhou o DN e mostrou o passo-a-passo de todo o processo de chegada, higienização dos lençóis e roupas usados nas enfermarias, UTI e no centro cirúrgico. Dessas peças novas vindas de fábricas, todo o enxoval do HUOL é reposto de seis em seis meses. Mas o material já utilizado sempre é reaproveitado dentro da unidade. "Mesmo uma peça que tem parte inutilizada pelo tempo de uso, pode ser cortada e reaproveitada para outra peça de roupa. Um lençol pode virar uma roupa, e depois se tornar um pano para limpar móveis", diz. A servidora faz questão de enfatizar: "Todo o uso, aliás, só pode ser feito depois da lavagem e esterilização, inclusive o que não serve mais e vai para o lixo comum, recolhido pela Urbana".

Segundo o diretor de operações da Companhia de Serviços Urbanos (Urbana), Alexandre Miranda, esse lixo passa a ser incluído na coleta normal, feita diariamente. "Por ser rejeitado após toda essa higienização, o material perde a classificação de lixo hospitalar e vai para o aterro sanitário metropolitano, em Ceará-Mirim. É o mesmo que ocorre com o lixo hospitalar que é incinerado, e que também vai para o aterro porque se torna cinza", explica Miranda. No caso de materiais diferentes de lençóis e que não são incinerados, a coleta do lixo hospitalar é feita por empresas contratadas por licitação. Em Natal, quem faz esse serviço é a Serquip.

O Nosso blog constatou que aqui em Santana do Matos já foram vendidos roupas com forros de bolsos de lixo Hospitalar

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