Adriano Abreu
Para
Dom Jaime Vieira, arcebispo de Nata, as ações precisam ultrapassar o
campo do imediatismo, criando condições de desenvolvimento
Dom Jaime Vieira esteve na Paraíba, na última quarta-feira, 16, onde a Assembleia Legislativa paraibana lançou a Campanha SOS Seca que tem como objetivo chamar a atenção dos governos Federal e Estadual para ações emergenciais e duradoras que resultem em melhorias das condições na convivência com a estiagem.
"Os deputados fizeram uma caravana pela Paraíba e constataram as dificuldades de cada região. Essa experiência resultou na elaboração de um documento oficial que reúne as recomendações dos parlamentares. O que me parece é que nós estamos ainda tentando aprender como lidar com a seca e suas consequências, quando, na verdade, já tínhamos que ter avançado nisso e estarmos aplicando medidas definitivas. Nós temos que questionar e cobrar a quem compete a viabilidade das soluções concretas e imediatas de enfrentamento à problemática da seca", disse o arcebispo.
Dom Jaime Vieira foi enfático ao afirmar que é preciso que a própria população, a sociedade civil organizada e entidades reconhecidas se mobilizem para que sejam tomadas medidas efetivas de convivência com a seca e que deixem de alimentar o que ele chamou de "velha indústria da seca". "É preciso que as nossas bancadas se articulem para ver que ações nós podemos empreender como estado, como governo e como sociedade civil para enfrentar essa problemática. Precisamos de políticas públicas que tenham continuidade e não de políticas de governo que somente alimentam a velha indústria da seca", afirmou o arcebispo.
No último domingo, a Tribuna do Norte publicou reportagem mostrando as projeções feitas pelo professor Luiz Carlos Baldicero Molion, PHD em Meteorologia e pesquisador da Universidade Federal de Alagoas, sobre os ciclos históricos das estiagens na região do semiárido nordestino. Para o professor Molion, é grande a possibilidade da região enfrentar um novo ciclo de invernos abaixo da média intercalados com períodos de estiagem pelos próximos nove anos. A projeção dele tem como base os estudos sobre o comportamento das temperaturas nos oceanos, relacionados com os levantamentos dos dados das séries históricas de chuvas nos estados nordestinos.
"Serão necessárias medidas emergenciais nos próximos anos. Mas é preciso ultrapassar o imediato. Não se pode mais perder tempo e adiar as ações que criem condições para ao desenvolvimento ao aproveitar as características", destaca o especialista. O professor alerta que os estados do Nordeste devem estar preparados para um longo período de poucas chuvas nos próximos anos. "Nos próximos nove anos, vamos ter chuvas abaixo do normal, em relação ao período entre 1977 e 1998", diz o pesquisador.
Estudos citados por Molion apontam que, na Paraíba, entre 1947 e 1976, na fase fria do Pacífico, choveu em média 650 mm por ano. No período de 1977 a 1998, as chuvas aumentaram para 760 mm. Foi o período quente no oceano. Ele afirma que os números não são tão precisos com relação ao Rio Grande do Norte, mas é possível constatar, com segurança, que o comportamento pluviométrico no território potiguar é semelhante ao do paraibano, uma vez que os dois estados estão na mesma região geofísica.
Em dezembro de 2012, Molion fez previsões para o período de fevereiro, março e abril deste ano de 2013 no interior da Paraíba e de outros Estados do Nordeste. A conclusão é que o modelo climático mostra uma redução de 50 mm a 150 mm por ano. As chuvas estarão abaixo do normal em todo o Nordeste. O ano de 2012 foi igual a 1951. Molion utilizou dados de 1952 para planejar a previsão para 2013. A tendência é de chuvas abaixo do normal. "A situação permanecerá. Não vejo boas perspectivas para 2013", diz. "Hoje, estamos retornando ao período de 1947-1976, quando as águas do Pacífico esfriaram", disse Molion. Por isso, a possibilidade de mais nove anos de estiagem.
"É arriscado dar como certo nove anos de chuvas escassas"
De acordo com a Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado (Emparn), não há registro histórico de seca por nove anos consecutivos no Rio Grande do Norte que comprovem a possibilidade da projeção feita pelo professor Molion. O meteorologista José Uelinton Pinheiro explica que os dados da climatologia do Rio Grande do Norte, disponíveis a partir de 1911, revelam que nunca se observou nove anos consecutivos de estiagem. "Já tivemos até três anos consecutivos de estiagem, mas nove anos nunca. A climatologia, o passado histórico das chuvas, não concorda com essa projeção", disse.
Segundo ele, a tecnologia disponível hoje permite que se faça uma previsão de 3 a 6 meses de antecedência. "Mesmo assim, em alguns casos, esse limiar de antecedência não é possível porque o comportamento da atmosfera às vezes apresenta um comportamento indeciso que não nos permite tirar conclusões mais concretas", explicou.
José Uelinton explica que a previsão da estação chuvosa é feita com dados globais de dezembro e início de janeiro. "É avaliado o comportamento tanto do Oceano Atlântico como do Pacífico; a temperatura da superfície do mar, ventos; pressão; radiação de ondas longas; entre outros aspectos. Esses dados nos permitem uma previsão com mais confiabilidade", disse José Uelinton.
Para o professor de Física e integrante do grupo de pesquisa de Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Francisco Alexandre da Costa, "é muito arriscado dar como certo que o semiárido terá nove anos consecutivos de chuvas escassas". E reforça o ponto de vista técnico: "Hoje, se trabalha com previsões climáticas com três, quatro meses de antecedência. Falar em uma previsão de nove anos de antecedência é muito difícil".
O professor entretanto, faz uma distinção entre o trabalho desenvolvido pelos meteorologistas da Emparn e as conclusões do estudo feito pelo professor Luiz Carlos Molion. Estas devem ser vistas como "uma projeção e não como uma previsão". Nem por isso, o estudo, segundo ele, deixa de ter importância.
"Essa discussão", disse Francisco Alexandre, "nos traz uma reflexão para a importância das previsões climáticas para o Nordeste do Brasil, sobretudo para o planejamento de ações do governo. É preciso que os gestores tenham a preocupação de ter políticas públicas que fortaleçam a convivência adequada da população com o meio em que se vive". O professor reforçou que com as previsões, os gestores podem buscar mais informações e conhecimento de atividades econômicas adequadas para o semiárido. "O Brasil está começando a entender que esse é um problema que precisa ser enfrentado", afirmou.
Encontro
A partir de hoje, 22, até a próxima quinta-feira, 24, o meteorologista da Emparn Gilmar Bristot participa do 15º Workshop Internacional de Avaliação Climática para o Semiárido Nordestino. O encontro, realizado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), visa elaborar documento com a previsão da estação chuvosa para os meses de fevereiro, março e abril, no semiárido.
Essa 15ª edição reúne pesquisadores dos estados do Nordeste, além de representantes do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE) e de centros meteorológicos internacionais. No final do mês de fevereiro, outro evento, dessa vez em Natal, vai traçar a previsão meteorológica para os meses de março, abril e maio.
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