O padre César Garcia, de 53 anos, de Goiânia, foi afastado de
suas funções religiosas – suspensão de ordem – pelo arcebispo da
cidade, dom Washington Cruz, por ter dado uma benção na residência do
casal homossexual Léo Romano, de 43 anos, e Marcelo Trento, de 38, no
dia 20 de maio. O padre foi comunicado na terça-feira pelo bispo de sua
decisão. Em entrevista ao GLOBO na manhã da quarta-feira, o padre
Garcia contou que não estimulou a união homoafetiva e nem simulou o
casamento entre o casal, que já está junto há onze anos. Já Léo Romano e
Marcelo Trento defendem a atitude do religioso. A Arquidiocese de
Goiânia confirmou o afastamento, mas diz que ele é “temporário” e que
vai apurar o ocorrido.
O padre César Garcia disse que fez uma celebração da palavra, como
uma forma de abençoar a nova casa do casal. O religioso, que não vestia
qualquer paramento e usava roupa comum na ocasião, classificou a atitude
de dom Washington Cruz como uma truculência, diz que não feriu qualquer
lei canônica e que comunicou previamente ao bispo que compareceria
nesta celebração.
- O bispo se deixou guiar por interpretações fantasiosas, como se eu
estivesse estimulado a união entre os dois. Não celebrei nenhum
casamento. Sou muito prudente, quem me conhece sabe disso. Respeito os
sacramentos e as pessoas. Tenho lisura nos meus atos. Não contrariei as
leis canônicas – disse o padre César Garcia.
Com a decisão, César Garcia está proibido de executar os ritos
sacramentais, como casamento e batizado, celebração de missa. Ele também
deve ser julgado por um tribunal eclesiástico. O padre foi ordenado há
30 anos e atua na paróquia São Leopoldo, no bairro Jaó.
Casal defende o padre
Diante do afastamento do padre, Léo Romano e Marcelo Trento saíram em
defesa do religioso. Romano também nega que a cerimônia tenha tido o
sentido de confirmar uma união e sabe que o direito canônico proíbe
celebração de casamento entre pessoas do mesmo sexo.
- Foi um lamentável episódio que ocorreu em virtude de uma bênção
dada pelo padre César em uma celebração em nossa casa, onde festejávamos
onze anos de união – disse Romano.
Em uma rede social, o arquiteto afirmou que o padre é conhecido da família e que falou “de amor” durante a visita:
“Padre César compareceu como amigo da família, que já celebrou
casamentos de irmãos, cunhados e batizou sobrinhos. Ele falou de amor e
abençoou nossa casa”, escreveu Romano na rede social.
O arquiteto classificou a atitude do bispo Washington Cruz de homofóbica.
“Sofremos essa reação homofóbica e retrógrada da igreja. Foi uma ação
excludente e que não permite sequer que um ser humano manifeste seu
afeto e carinho por outro”, escreveu.
De acordo com Romano, cerca de 120 pessoas participaram da festa em
que o padre estava presente, e que comemorava onze anos da união do
casal. Eles estavam inaugurando a casa nova, no condomínio Aldeia do
Vale, de classe média alta em Goiânia.
Para o padre, caso teria tido tratamento legalista
O padre César Garcia diz acreditar que o bispo Washington Cruz foi
pressionado por setores religiosos para adotar uma punição para a sua
conduta:
- Fiz uma comunicação prévia. Por que então tomou essa atitude
posterior? Com essa atitude, ele está matando a Igreja, o direito de ir e
vir das pessoas aos encontros. Quem sou eu para julgar. Sua santidade o
Papa Francisco deixou isso claro no início do seu pontificado a ser
questionado sobre os homossexuais. Houve um pré-julgamento.
O padre ainda diz que tem recebido ligações de padres de vários
lugares, que respeita a decisão do seu superior, mas que quer fazer esse
debate. Ele critica o que entende ser excesso de poder nas mãos do
bispo.
- O bispo tem poder absoluto. Funciona como uma monarquia. Tanto que
ele fez a condenação a mim sem ouvir testemunhas. Sem a presunção da
verdade. Ele se baseou nos entretantos. Com base em fotos de internet e
sob a pressão de assessores e de setores fundamentalistas da igreja.
Ele também critica o tratamento legalista que teria sido dado ao caso:
- Não é questão legalista, mas de tratar as pessoas com respeito,
bondade e acolhimento. Como padre, sou filho da Igreja. Não sou
empregado da Igreja. E, com esse ato, ele baniu um filho, desagregou a
família. E o filho tem o direito de pensar diferente. De ter suas
razões.
Para o religioso, o bispo agiu de forma fundamentalista.
- Numa sociedade plural, numa pastoral urbana não é possível mais
recorrer aos resquícios do fundamentalismo e usar a própria Igreja para
punir aqueles que estão acolhendo as pessoas. O que ocorreu comigo foi
uma condenação sumária e intempestiva.
O Globo
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