Apesar do alto número, delegacia especializada não tem estrutura para atender toda a demanda do RN
Diego HervaniRepórter/JH
O governo já deixou claro que a segurança pública é uma das
principais preocupações atuais no Rio Grande do Norte. As recentes
rebeliões e a fuga de mais de 32 detentos em Alcaçuz aumentou ainda mais
a apreensão. Entretanto, dados divulgados em um livro publicado pelo
coordenador de Informática e Estatísticas da Secretaria de Segurança
Pública (Sesed), Ivenio Hermes, mostram que é necessário um olhar mais
atento aos crimes contra crianças e adolescentes. Apenas em 2014, 404
casos de violência contra menores de 12 anos foram registrados no RN.
Desses 404 casos contra crianças, 398 foram registrados como
violência sexual, podendo se incluir abusos, estupros e exploração.
Quando se soma os crimes ocorridos com crianças e adolescentes esse
número sobe para 459. Uma das informações que mais chama atenção é que
desses 459, 196 foram cometidos por pessoas que fazem parte da família
da vítima. Os padrastos aparecem na liderança, responsáveis por 17% dos
crimes (71 casos), seguidos pelos pais, com 15% (62 casos). Os tios
representam 7% (28 casos) e os avôs 3% (10 casos). Dividindo por faixa
etária, crianças entre 8 e 11 anos são as maiores vítimas, com 148
casos. A sequência é a seguinte: dos 12 a 14, 145 casos; de 4 a 7, 97
casos; dos 15 aos 18, 50 casos; e de 0 a 3, 19 casos.
A titular da Delegacia Especializada na Defesa de Crianças e
Adolescentes (DCA), Rossana Pinheiro, disse que os números “reais” são
bem maiores do que esse. Segundo ela, um dos motivos para que as
estatísticas não sejam maiores é que a estrutura da DCA está longe da
ideal. “Para se ter uma ideia, quando a delegacia foi criada, em 2001,
ela tinha uma equipe de 18 pessoas, contando com o delegado e o
escrivão. 14 anos de passaram e a demanda aumentou. Ao invés do efetivo
aumentar, ele acabou diminuindo. Hoje temos uma equipe de apenas oito
pessoas trabalham na delegacia”.
A falta de pessoa fez com que a delegada tomasse uma decisão. A DCA
passaria a atender apenas casos de Natal e Região Metropolitana. “Na lei
não existe nada que proíba outras delegacias de investigar os casos de
agressões contra crianças e adolescentes. Falamos com o nosso chefe e
mostramos que não tínhamos condições de atender todo o Rio Grande do
Norte, que era a ideia inicial quando a DCA foi criada. Estamos com oito
pessoas na equipe, se acontecesse um caso na região Oeste, teríamos que
enviar metade da equipe para lá e aqui ficaria descoberto”.
Outro fator que atrapalha o trabalho da DCA é a subnotificação. O
número de pessoas que não denunciam agressões contra crianças e
adolescentes é muito grande. Com isso, delegada Rossana conta que tem
feito alguns trabalhos sociais para tentar reverter a situação. “Existem
estatísticas que apontam que os casos denunciados de violência sexual
representam apenas 10% do que realmente acontece. Nós estamos sempre
participando de projetos e conversando com os menores”.
A intenção, segundo Rossana, é fazer com que esses menores percebam
que estão sofrendo violência sexual. “Os agressores se aproveitam da
inocência dessas crianças para abusarem delas. Ao conversar com esses
menores, nós mostramos como esses abusos acontecem para que eles
identifiquem quando estiveram sofrendo a mesma coisa. Depois, falamos
para que eles procurem alguém de confiança para denunciar, seja um
vizinho ou parente. Elas também podem procurar diretamente a polícia”.
Um dos canais mais usados pela DCA é o chamado “Disque 100″, que foi
criado exatamente para servir de canal da delegacia com as vítimas de
violência sexual. “Pelo Disque 100, o atendente vai anotar tudo o que
for dito, independentemente se a denúncia estiver sendo feita por um
adulto ou criança. Eles anotam e nos encaminham”, afirmou Rossana, que
ainda lembrou da importância dos profissionais da saúde e educação no
combate aos crimes contra crianças e adolescentes. “Os profissionais da
saúde, quando alguma criança chega no hospital com algum indicativo de
violência, seja sexual ou não, têm a obrigação de notificar as
autoridades. A mesmo coisa serve para os educadores, como os
professores”.
As estatísticas também trazem a divisão por regiões de Natal, que é o
município com o maior número de ocorrências. Apenas a Zona Norte foi
responsável por 40% dos casos (159 ocorrências). A Zona Oeste com 28%
(110 ocorrências), Zona Leste com 17% (65 ocorrências) e Zona Sul com
15% (59 ocorrências), completam o ranking. Para Rossana, entretanto,
esses números não significam necessariamente que as classes mais “ricas”
apresentam uma menor quantidade de violência contra menores.
“O problema é que as classes que têm um recurso financeiro maior,
geralmente tentam esconder a situação. Muitas dessas famílias não
notificam os casos para a delegacia, elas preferem outro meios, como
tratamentos médicos. Parece que elas acreditam que aquela situação pode
arranhar a imagem familiar. Já as famílias de um poder aquisitivo menor,
normalmente têm uma maior facilidade e disposição para falar com as
autoridades e denunciar o que está acontecendo”.
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