Um total de seis ações do Ministério
Público Federal (MPF) em Caicó resultaram em condenações de dois
ex-prefeitos de Tenente Laurentino Cruz: Airton Laurentino Júnior e
Joarimar Tavares. As sentenças, proferidas entre setembro e dezembro de
2015, apontam a participação de ambos junto a vários funcionários do
Município e empresários em um esquema de fraude a licitações e a um
programa de compra de merenda escolar. Das decisões cabem recursos.
O “modus operandi” geralmente
envolvia a produção de planilhas falsas para simular a participação de
diversas empresas nas licitações – algumas das quais seus proprietários
negam ter concorrido a qualquer obra na cidade –, além de acerto prévio
de preços e outras irregularidades que levavam ao favorecimento de
construtoras e fornecedoras de produtos ligados ao grupo dos
ex-prefeitos.
As fraudes ocorreram entre 2005 e
2008, quando Joarimar Tavares chefiava o Executivo Municipal. Porém o
então prefeito havia não só sido indicado pelo anterior, Júnior
Laurentino (como é conhecido Airton Laurentino Júnior), como abriu mão
de concorrer à reeleição, deixando espaço para Júnior Laurentino retomar
o cargo em 2008, tamanha sua influência. Mesmo durante a gestão de
Joarimar, Júnior mantinha parentes em cargos fundamentais da Prefeitura
que permitiram a concretização das irregularidades.
O filho, Airton Laurentino Neto, e a
nora, Karydja Soares, se revezavam na Presidência da Comissão Permanente
de Licitação (CPL). Em seu depoimento, Joarimar afirmou que dava a
Airton Neto total liberdade para tratar dos convênios da Prefeitura com a
Caixa Econômica Federal. De acordo com o MPF, a influência de Júnior
Laurentino era tamanha que chegava a ser “identificado como
administrador de fato pelos munícipes”.
Medicamentos – Uma das
sentenças se refere ao procedimento 013/2007, que previa a aquisição de
medicamentos e material de uso hospitalar, no valor de R$ 79.362,71.
“(...) em verdade, não houve efetivo certame entre as empresas
convidadas, mas a elaboração de um processo licitatório com o fim de dar
aparência de legalidade à escolha da empresa contratada de forma
direta”, destaca a juíza Sophia Nóbrega. A fraude foi montada com
colaboração das empresas Phospodont e CRM, através de Ana Maria Pinheiro
e Renilson Nery de Moura. Joarimar Tavares homologou o procedimento
mesmo sem as assinaturas dos membros da comissão de licitação.
“Cooperativa fantasma” – Outra
condenação diz respeito a fraudes no programa Compra Direta, que previa
a aquisição de alimentos de pequenos produtores rurais para a merenda
escolar. Júnior Lauretino constituiu uma “cooperativa fantasma” e
simulava a venda de produtos dessa cooperativa ao Município. Além disso,
agricultores eram arregimentados pelo grupo para cederem seus dados
pessoais e constarem como participantes do Compra Direta.
Depoimentos de alguns desses
agricultores confirmaram que eles nunca chegaram a fornecer os produtos à
Emater, nem ao Município, porém receberam recursos como se tivessem
efetuado as vendas e repassaram parte dos valores aos integrantes do
esquema. Alguns dos produtos supostamente produzidos pela “cooperativa
fantasma” veio, na verdade, de uma fábrica de polpa de frutas instalada
na residência de Júnior Laurentino, da qual era sócio Manoel Vicente da
Silva Filho.
Esses alimentos teriam sido
produzidos pela Associação dos Produtores de Frutas de Tenente
Laurentino Cruz, porém não surgiu qualquer prova da existência da
associação que, em seu estatuto, de agosto de 2005, tinha a nora do
ex-prefeito, Karydja Soares, como presidente. O próprio Joarimar
confessou que seu antecessor possuía a fábrica e vendia polpa para a
Prefeitura.
As notas fiscais eram subscritas pelo
coordenador da Secretaria Municipal de Agricultura, José Edson da
Silva, indicando o recebimento de produtos que não vieram, de fato, dos
agricultores listados nos documentos. Manoel Vicente Filho agia junto
com outros envolvidos principalmente como arregimentador de pessoas para
figurarem como “laranjas”, a fim de justificar a produção. As
irregularidades resultaram em um dano estimado de R$ 42.881 aos cofres
públicos.
Obras diversas – Outra
condenação diz respeito a fraudes em diversas licitações que incluíram
irregularidades na constituição da comissão de licitação, ausência de
assinaturas em documentos, certidões expedidas com data posterior à
apuração das propostas, entre outros ilícitos. Um procedimento
(008/2007) previa a drenagem e pavimentação de vias no valor de R$
103.344,60 e foi deflagrado sem sequer terem sido nomeados os membros da
CPL. Vários documentos não foram assinados e as empresas “concorrentes”
foram escolhidas aleatoriamente.
Em outra licitação via convite,
009/2007, que previa a construção de escola com seis salas de aula, as
irregularidades se repetiram. A vencedora foi a Construtora Seridó
Oriental. Rosan Marçal e Expedito Júnior, sócios da empresa, atuavam na
Associação dos Municípios do Seridó Oriental - AMSO, instituição
presidida diversas vezes por Júnior Laurentino. Os projetos, inclusive,
foram elaborados contando com o apoio do serviço de topografia da
associação.
Favorecimento - Outras três
ações trataram de contratos para obras nas quais também foram
favorecidas empresas como a Construtora Seridó Oriental. “(...) as
empresas de Rosan Marçal, dentre as quais a Seridó Oriental, se
revezavam na execução das obras do Município de Tenente Laurentino Cruz
ao longo de toda a gestão de Joarimar Tavares, sempre mediante fraudes
em certames licitatórios”, aponta a Justiça Federal.
De acordo com o MPF, os envolvidos
nas irregularidades chegavam a adiar o resultado das licitações para os
sócios da Seridó conhecerem os valores dos “concorrentes”. Dois convites
do ano de 2005 previam pavimentação de vias e ampliação do sistema de
esgotos e foram vencidos pela Construtora Água Doce, também pertencente a
Rosan Marçal. As planilhas utilizadas pelas empresas participantes da
“licitação” e pela Prefeitura continham os mesmos erros de português.
A obra de 93 mil recebeu um aditivo
ilegal de 90 mil, quase duplicando o valor total do serviço, quando o
máximo permitido em lei é um acréscimo de 25%. O aditamento, aliás,
ocorreu 11 meses após a contratação, quando o prazo inicial previsto era
de 90 dias para a execução total.
A Seridó Oriental ganhou ainda outras
duas licitações por convites, em 2016, para drenagem, pavimentação de
ruas e construção de um pórtico. Nesse último caso, a AMSO fazia a
fiscalização da obra, ou seja: “é dado concluir que Rosan e Expedito, na
condição de sócios-administradores, atuavam, ao mesmo tempo, como
executores da obra e como fiscalizadores”.
Outros quatro convites, datados de
2006, tratavam da aquisição de alimentos para merenda escolar e produtos
de limpeza e novamente o esquema funcionou, com os empresários
“perdedores” tendo apenas apresentado as propostas, sem participar das
supostas sessões de abertura dos preços. “Dessa forma, restou comprovado
o favorecimento à empresa Maria Aparecida de Souza Medeiros, pois,
tendo prévio conhecimento das propostas dos concorrentes, podia elaborar
uma planilha inferior.”
Os seis processos tramitam na Justiça
Federal sob os números 00000215-57.2013.4.05.8402;
00000217-27.2013.4.05.8402; 00000218-12.2013.4.05.8402;
00000219-94.2013.4.05.8402; 00000220-79.2013.4.05.8402; e
00000221-64.2013.4.05.8402.
Confira as penas aplicadas aos condenados
Joarimar Tavares de Medeiros –
sentenciado cinco vezes à perda da função pública; ressarcimento dos
danos; suspensão dos direitos políticos por até oito anos; pagamento de
multa de R$ 48 mil; e proibição de contratar com o Poder Público pelo
prazo de até cinco anos.
Aírton Laurentino Júnior -
sentenciado seis vezes à perda da função pública; ressarcimento dos
danos; suspensão dos direitos políticos por até dez anos; pagamento de
multa de R$ 133 mil; proibição de contratar com o Poder Público pelo
prazo de até dez anos.
Airton Laurentino de Medeiros Neto -
sentenciado cinco vezes à perda da função pública; ressarcimento dos
danos; suspensão dos direitos políticos por até oito anos; pagamento de
multa de R$ 48 mil; e proibição de contratar com o Poder Público pelo
prazo de cinco anos.
Karydja Soares Bezerra - sentenciada em quatro processo ao ressarcimento dos danos.
Rosan Marçal de Araújo -
sentenciado quatro vezes à perda da função pública; ressarcimento dos
danos; suspensão dos direitos políticos por até oito anos; multa no
valor de R$ 34 mil; e proibição de contratar com o poder público pelo
prazo de cinco anos.
Expedito Araújo de Lima Júnior - sentenciado
três vezes à perda da função pública; ressarcimento do dano; suspensão
dos direitos políticos por até oito anos; multa no valor de R$ 24 mil; e
proibição de contratar com o poder público pelo prazo de cinco anos.
Gutemberg Teodoro Alves - sentenciado
em dois processos à perda da função pública; ressarcimento do dano;
suspensão dos direitos por oito anos; multa de R$ 17 mil; e proibição de
contratar com o poder público pelo prazo de cinco anos.
Construtora Seridó Oriental Ltda. -
sentenciada em quatro processo ao ressarcimento do dano; multa R$ 10
mil; e proibição de contratar com o poder público pelo prazo de cinco
anos.
GTA Construções Ltda. ME: sentenciada
em dois processos ao ressarcimento do dano; multa R$ 10 mil; e
proibição de contratar com o poder público pelo prazo de cinco anos.
Construtora Zero Hora (Processo
00000219-94.2013.4.05.8402) - ressarcimento do dano e proibição de
contratar com o poder público pelo prazo de três anos.
Francisco de Assis Alves dos Santos (Processo
00000219-94.2013.4.05.8402) - ressarcimento do dano e proibição de
contratar com o poder público pelo prazo de três anos.
Manoel Vicente da Silva Filho (Processo
00000215-57.2013.4.05.8402) - perda da função pública; ressarcimento do
dano; suspensão dos direitos políticos por dez anos; multa no valor de
R$ 85 mil; e proibição de contratar com o Poder Público pelo prazo de
dez anos.
Francisco de Assis de Morais Araújo (Processo
00000215-57.2013.4.05.8402) – perda da função pública; suspensão dos
direitos políticos por oito anos; multa de R$ 42 mil; ressarcimento do
dano; e proibição de contratar com o poder público pelo prazo de dez
anos.
José Edson da Silva (Processo
00000215-57.2013.4.05.8402) perda da função pública; suspensão dos
direitos políticos por nove anos; multa de R$ 42 mil; ressarcimento do
dano; e proibição de contratar com o Poder Público pelo prazo de dez
anos.
Renilson Nery de Moura (Processo
00000217-27.2013.4.05.8402): ressarcimento dos danos; suspensão dos
direitos políticos por seis anos; pagamento de multa de R$ 8 mil; e
proibição de contratar com o poder Público pelo prazo de cinco anos.
Ana Maria Pinheiro Ferreira (Processo
00000217-27.2013.4.05.8402) – Perda da função pública; suspensão dos
direitos políticos por seis anos; multa de R$ 8 mil; ressarcimento do
dano; e proibição de contratar com o poder público pelo prazo de cinco
anos.
CRM Comercial Ltda. (Processo
00000217-27.2013.4.05.8402) - Ressarcimento do dano e proibição de
contratar com o poder público pelo prazo de cinco anos.
Phospodont Ltda. (Processo
00000217-27.2013.4.05.8402) - Ressarcimento do dano e proibição de
contratar com o poder público pelo prazo de cinco anos.
Maria Elivânia da Silva Santos - Sentenciada em três processos ao ressarcimento dos danos
Maria Aparecida de Souza
(Processo 00000220-79.2013.4.05.8402) – Perda da função pública;
suspensão dos direitos políticos por sete anos; multa de R$ 9 mil;
ressarcimento dos danos; e proibição de contratar com o poder público
pelo prazo de cinco anos.
Maria Aparecida de Souza Medeiros EPP
(Processo 00000220-79.2013.4.05.8402) – Proibição der contratar com o
poder público pelo prazo de cinco anos e ressarcimento dos danos.
Rozenilda Lúcia Tomaz de Medeiros (Processo 00000221-64.2013.4.05.8402) –
Perda da função pública; suspensão dos direitos políticos por seis
anos; multa de R$ 7 mil; proibição de contratar com poder público pelo
prazo de cinco anos; e ressarcimento dos danos.
Construtora Água Doce Ltda. (Processo 00000221-64.2013.4.05.8402) - Proibição de contratação com o poder público pelo prazo de cinco anos e ressarcimento dos danos.
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