“Eduardo Cunha redistribuía propina a Temer, com ‘110%’ de certeza”. A
frase, que liga o presidente Michel Temer ao ex-presidente da Câmara
Eduardo Cunha, está em um dos depoimentos prestados em 23 de agosto pelo
delator Lúcio Bolonha Funaro, apontado como operador de políticos do
PMDB em esquemas de desvio de dinheiro público. Nos depoimentos, há
várias citações a casos em que Temer, Cunha e outros integrantes do
partido teriam levado propina. Mas também há menções a episódios em que
houve divergências internas, como na definição de quem indicaria um
cargo na Caixa Econômica Federal (CEF) que renderia vantagens indevidas.
Funaro disse ainda que José Yunes, amigo e ex-assessor de Temer, lavava
dinheiro para o presidente e que a maneira mais fácil para isso era por
meio da compra de imóveis.
Segundo Funaro, durante os governos do PT, os então deputados Michel
Temer (PMDB-SP), Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Henrique Alves (PMDB-RN)
disputavam cargos, mas de formas diferentes. Cunha atuava no “varejo”,
ou seja, focava em alguns cargos. Os outros dois agiam no “atacado”. Na
semana passada, Janot denunciou Temer e outros seis peemedebistas,
acusando-os de integrarem uma organização criminosa que desviou dinheiro
de diversos órgãos públicos e empresas estatais, como Petrobras,
Furnas, Caixa, Ministério da Integração Nacional e Câmara dos Deputados.
Segundo o delator, Cunha lhe contou que o ex-sindicalista André Luiz
de Souza explicou a Temer como funcionava o FI-FGTS, o fundo de
investimento alimentado com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço. Souza fazia parte do conselho do fundo e é acusado de desviar
dinheiro de lá. Segundo o termo de depoimento de Funaro, “Cunha disse
que André de Souza explicou para Temer como funcionava o FI-FGTS, que
aquilo seria como um ‘mini BNDES’”. É uma referência ao banco de
desenvolvimento que, assim como o FI-FGTS, libera recursos para as
empresas investirem em projetos de infraestrutura.
Ainda de acordo com a delação, “Moreira Franco falou para o Temer que
isso seria uma ‘oportunidade para fazer dinheiro’”. Assim, “inicia uma
briga” entre o grupo formado por Cunha, Funaro e Henrique Alves, contra
Moreira Franco. Ele queria manter um indicado seu numa das
vice-presidência da Caixa. Moreira conseguiu isso por algum tempo, mas
depois o cargo foi preenchido por alguém ligado aos adversários
internos. Funaro é claro: o objetivo de seu grupo político “era
conseguir o FI-FGTS, pois era uma fonte de renda”.
O delator deu detalhes sobre como Yunes lavaria dinheiro para Temer.
Segundo ele, o amigo do presidente, “além de administrar, investia os
valores ilícitos em sua incorporadora imobiliária”. Mais adiante disse
que “não sabe se tais imóveis adquiridos por Michel Temer estão em nome
de Michel, familiares ou fundos”, mas “sabe, por meio de Eduardo Cunha,
que Michel Temer tem um andar inteiro na Avenida Brigadeiro Faria Lima,
em São Paulo/SP, num prédio que tinha sido recém-inaugurado”.
Funaro disse ainda que Yunes sabia que havia dinheiro em uma caixa
entregue a ele no escritório do amigo de Temer. Nessa caixa, afirmou o
operador do PMDB, haveria R$ 1 milhão de propina endereçada a Temer. Os
recursos viriam do caixa dois da Odebrecht.
Em relação a Moreira, além das irregularidades na Caixa, Funaro citou
uma informação que, segundo ele, lhe foi repassada pelo empresário
Henrique Constantino, da família proprietária da Gol. Moreira, que já
foi ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), teria atuado na
Infraero para transferir sem licitação um hangar da falida Varig para a
empresa.
Em nota, Moreira Franco atacou Funaro: “Veja a que ponto chegamos: um
sujeito com extensa folha corrida com crédito para mentir. Não conheço
essa figura, nunca o vi. Bandidos constroem versões ‘por ouvir dizer’ a
lhes assegurar a impunidade ou alcançar um perdão por seus inúmeros
crimes”.
O GLOBO procurou o Planalto, mas a orientação foi falar com a defesa
do presidente. O GLOBO não conseguiu contato com a o advogado de Temer,
nem com José Yunes e Henrique Constantino.
O GLOBO
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