Rio - A Reforma da Previdência do governo Bolsonaro
restringirá a distribuição gratuita de remédios do Sistema Único de
Saúde (SUS) determinada por decisões judiciais. A Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) 6 que tramita na Câmara modifica o parágrafo 5º do
Artigo 195 da Constituição que trata do orçamento da Seguridade Social.
Com a nova redação prevista para a lei, o governo inclui na regra que
nenhum benefício ou serviço pode ser criado ou estendido "por ato
administrativo, lei ou decisão judicial, sem a correspondente fonte de
custeio total". Além disso, impede que aposentados reivindiquem
adicionais ou revisões na Justiça.
Segundo o advogado da Federação das Associações de
Aposentados do Rio (Faaperj), Guilherme Portanova, a medida engessará o
Poder Judiciário, que não poderá mais atender a pedidos de doação de
medicamentos em sentenças. "Com a alteração, o governo engessa o
Judiciário", afirma.
De acordo com o advogado, "ao proibir que o Judiciário
estenda direitos não previstos expressamente em lei, a PEC 6 acaba com a
figura da grande invalidez, que é o acréscimo de 25% no benefícios de
aposentados que necessitam de ajuda de terceiros para as tarefas
diárias".
Portanova lembra que o direito foi reconhecido no fim
de 2018 em recurso repetitivo na Primeira Sessão do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que o estendeu a todas as modalidades de aposentadoria e
não só para a de invalidez, conforme previsto em lei.
Mas como o INSS não repassou o adicional aos demais
aposentados que necessitam da ajuda de terceiros, embora precisem de
cuidados, muitos têm recorrido à Justiça.
"Com a PEC em vigor, o STJ não poderia ter concedido o
direito com base neste artigo. Este tema, inclusive está suspenso por
decisão do STF, que julgará o mérito", acrescenta João Badari, do
escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
Além desses impedimentos, a reforma cria idade mínima
de 62 anos (mulheres) e 65 (homens) pedirem aposentadoria, amplia o
tempo de contribuição a 40 anos para o segurado do INSS receba benefício
integral. A PEC acaba com acúmulo de pensão por morte e aposentadoria,
reduz benefícios e limita o pagamento do abono do PIS/Pasep.
Decisões judiciais serão inviabilizadas
A alteração da redação do Artigo 195 da Constituição
por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6, que trata do
orçamento da Seguridade Social, vai impactar diretamente a distribuição
de medicamentos de alto custo pelo Sistema Único de Saúde (SUS)
determinada pela Justiça. Isso aconteceria justamente pelo fato de o
Judiciário ficar impedido de prover ou ampliar um benefício que não
tenha fonte de custeio.
"A decisão judicial que manda dar medicação de alto
custo fica inviabilizada por não ter fonte de custeio prévia", adverte
João Badari, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados. "Na prática,
as ações contra a União, estados e municípios que reivindicam medicação
do SUS seriam fulminadas", complementa Guilherme Portanova, da
Federação dos Aposentados.
Para Badari, essa decisão fere o direito fundamental à
saúde do cidadão. "Como uma pessoa que não tem dinheiro para comprar
medicamento vai sobreviver?", questiona.
"Quem conhece um pouco de Direito Previdenciário, sabe
que essa regra é direcionada ao legislador e ao administrador público e
jamais poderia ser aplicada ao magistrado que atua no caso concreto",
avalia Portanova. Ao que Pauline Navarro, do escritório Vargas e Navarro
Advogados, complementa: "O novo texto força uma interpretação fria da
lei".
Outros benefícios do INSS podem não ser concedidos
Outros benefícios que têm sido concedidos
judicialmente, também podem estar com os dias contados caso a Reforma da
Previdência seja aprovada no Congresso. O alerta é de Adriane Bramante,
presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).
"A PEC vai influenciar todas as ações que o juiz
entenderia ser possível criar, majorar ou estender benefícios
previdenciários", acrescenta.
Como exemplo a especialista cita o auxílio-doença
parental. "A mãe que teve uma criança que nasceu doente. Ela precisará
ficar no hospital com ela mais tempo do que aquele do
salário-maternidade. Existem algumas ações na Justiça (poucas, mas têm),
que concedem o auxílio-doença parental. Com a alteração da lei, isso
também muda", diz.
Ela acrescenta que muitas leis foram editadas após
casos reais. "O salário-maternidade para adotante, por exemplo, é uma
lei relativamente recente. Ela foi publicada após diversas decisões
judiciais concedendo. É a necessidade social que nasce do caso
concreto", explica.
Mais de 23 milhões ficarão sem o PIS/Pasep
Um outro ponto criticado por especialistas é a redução
do limite para quem recebe o abono do PIS/Pasep. Esse item, que não
trata do sistema previdenciário, foi mais um que acabou apresentado como
"contrabando" na reforma de Bolsonaro. Atualmente, o abono salarial é
pago para quem ganha até dois salários mínimos.
A reforma propõe que o benefício ficará restrito aos
trabalhadores da iniciativa privada e aos servidores públicos que ganham
até um salário mínimo de remuneração mensal. Com a mudança, 23,4
milhões de trabalhadores, privados e funcionários públicos de baixa
renda, devem perder o direito ao benefício, que chega a R$ 998 por ano.
Hoje para receber o abono, o cidadão deve ter
trabalhado com registro formal por pelo menos 30 dias no ano-calendário
de referência, tendo recebido até dois salários mínimos, em média.
Também é preciso estar inscrito no programa PIS/Pasep há, no mínimo,
cinco anos. A Caixa Econômica Federal paga o PIS a trabalhadores da
iniciativa privada, e o Banco do Brasil libera o Pasep aos servidores.
É bom lembrar que o trabalhador que perde o prazo de
saque do abono salarial fica sem o dinheiro, que vai para o FAT (Fundo
de Amparo ao Trabalhador). Porém, já houve casos de empregados que
conseguiram na Justiça o direito de receber o dinheiro após o fim do
prazo.
Com informações de
MARTHA IMENES
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