Um fato relevante publicado pela Comissão de
Valores Mobiliários (CVM) na noite da última terça-feira (23) anunciava o
início de uma nova etapa na trajetória da BR Distribuidora, subsidiária
de distribuição e venda de combustíveis e lubrificantes da Petrobras
SA. A venda de 30% de pouco mais de dois terços das ações representa a
privati-zação da empresa, que agora tem 58,7% de suas ações pulverizadas
no mercado.
Mas quais efeitos o consumidor final deve sentir a partir da
operação? Na avaliação do consultor na área de Petróleo e Gás Bruno
Iughetti, a mudança na composição acionária deve resultar em uma
otimização no setor, e isso também significa preços mais competitivos.
"A Petrobras vai ter que ser uma empresa mais competitiva e isso vai
refletir nos preços finais de produtos comercializados. Hoje, há uma
concentração concorrencial nas mãos da companhia e, evidentemente a
venda deixará o mercado mais equilibrado e mais voltado à busca de
eficiência. A BR vai ficar mais competitiva e tudo isso vai refletir nos
preços finais dos produtos comercializados", explica Iughetti.
O consultor na área de Petróleo e Gás destaca que a operação faz
parte de uma programação de desinvestimentos da companhia e vê como
positiva a retirada do setor de distribuição e revenda.
"A companhia tem que manter o seu foco na área de exploração e
produção de petróleo, principalmente em relação ao Pré-Sal. Essa
movimentação faz parte de um plano de desinvestimento da companhia em
atividades que não são sua verdadeira vocação, como é o caso da
distribuição e revenda", detalha Bruno Iughetti.
Já o consultor internacional em energia Expedito Parente Junior
pondera que alguns outros pontos também devem ser levados em
consideração. Ele ressalta que, de fato, quando o número de players em
um determinado setor cresce, a expectativa de uma competição ainda maior
acompanha o movimento.
Entretanto, ele destaca que já não existia mais um monopólio da BR.
"A operação não reestrutura o setor. O elo de distribuição já era
diverso, com várias redes distribuidoras de capital privado, inclusive
regionais e locais", frisa.
De acordo com os dados sobre abastecimento de combustíveis mais
recentes da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
(ANP), a BR Distribuidora detém 17,6% de participação de mercado no
Brasil.
A maior parte dos postos de combustíveis no País é de bandeira branca
(44,1%). Próximo à fatia da BR, aparecem Ipiranga (13,9%); Raízen
(Shell e Cosan), com 11,4% e outras (8,2%). Aparecem, em seguida, Alesat
(2,8%); Sabbá (1%) e SP (1%).
"Eu não vejo grandes modificações, mas uma expectativa maior de mais
investimentos, o que acaba trazendo algum benefício, especialmente em
qualidade do serviço prestado ao consumidor. A qualidade do produto e os
preços são definidos muito mais pelo refino", pondera Expedito Parente
Junior.
Refino
Assim, conforme o consultor, uma mudança no elo de refino da
companhia representaria uma reconfiguração de mercado mais visível. "Se
isso fosse no refino, aí sim haveria uma mudança estrutural, porque hoje
praticamente 100% do refino é da Petrobras. Há um monopólio e isso
permite ao Governo controlar os preços", diz Parente Junior.
Ele lembra que isso, por um lado, representa uma vantagem. Como
estatal e com o controle majoritário do Governo, a Petrobras fica menos
exposta às grandes flutuações de preços do petróleo no mercado
internacional. Por outro lado, há uma desvantagem.
"É natural que um setor monopolizado tenha menor capacidade de
investimento e menor eficiência em relação a um setor com grande
competitividade entre os players", explica Expedito Parente Junior.
O assessor econômico da presidência do Sindicato do Comércio
Varejista de Derivados de Petróleo do Estado do Ceará (Sindipostos-CE),
Antônio José Costa, não vê grandes impactos da medida a curto e médio
prazo, mas visualiza uma concorrência mais acirrada entre as empresas
distribuidoras no futuro.
"A curto e médio prazo, não vejo nenhuma repercussão. Mas a longo
prazo, o varejo deve presenciar uma concorrência mais acirrada. A
empresa deve passar a ter mais condições de concorrer com grandes
empresas nacionais e com multinacionais. O consumidor deve sentir a
melhora na prestação de serviços prestados por essas empresas e também
nos preços", analisa.
Mercado
A disponibilização das ações da BR Distribuidora vai colocar nos
cofres da Petrobras R$ 8,6 bilhões. A petroleira detinha 71,25% do
capital da empresa antes dessa operação. A estatal fechou a venda de
quase 350 milhões de ações por R$ 24,50 cada uma. Com isso, agora a
Petrobras SA passou a deter 41,25% das ações da BR distribuidora.
Bolsa
O assessor de investimentos Thomaz Bianchi explica que o mercado se
mantém neutro diante da operação e que não há grandes impactos em termos
de negociações na Bolsa brasileira. Sobre o valor das ações, ele avalia
que não representa uma "extrema desvalorização" ante o preço que os
papéis valem.
"É um preço muito justo, é tanto que as cartas da recomendação da XP
Investimentos e Eleven Financial são neutras, porque não há um prêmio
tão interessante em relação a isso. Não é um valor injusto. Não é um
setor monopolizado", explica Bianchi.
De acordo com o relatório da XP, o preço-alvo (potencial de
valorização) é de R$ 30. Em um cenário mais negativo, as ações podem
chegar a R$ 24, o que representaria a perda de R$ 0,50 por ação.
Mercado
Desde que abriu capital em dezembro de 2017, a BR distribuidora se
valorizou 80%, indo de R$ 19,9 bilhões a R$ 31,5 bilhões em valor de
mercado. No processo, a BR superou a concorrente Ultrapar, da rede de
postos Ipiranga. Mas a ultrapassagem se deveu mais a perda de valor da
concorrente do que à própria valorização.
Na época do IPO (Oferta Inicial de Ações) da BR Distribuidora, a
Ultrapar valia R$ 40,7 bilhões. Hoje, a empresa tem capitalização de
mercado de R$ 22,7 bilhões. Segundo dados da Economatica, a Ultrapar
supera a BR em valor de caixa, com R$ 6,4 bilhões versus R$ 3,85
bilhões. O total da dívida da primeira, no entanto, é quase o triplo do
que o total da segunda, com R$ 16,5 bilhões contra R$ 6,35 bilhões.
A venda de ações da Petrobras foi um dos vetores da alavancagem da
empresa. Desde que a operação foi anunciada, em abril, a BR se valorizou
18,88%. Ontem, as ações tocaram sua máxima histórica, a R$ 27,63, e
fechou a R$ 26,32, alta de 1,19%.
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