O Brasil precisa ampliar os investimentos em infraestrutura para, pelo menos, 4% ou 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano. Hoje, esse número está abaixo de 2%, o que tem provocado uma rápida deterioração dos ativos existentes. Para reverter a situação, o País terá de dobrar os recursos injetados no setor num período de duas décadas. Isso resultaria em maior bem-estar para a população, competitividade para as empresas e resiliência frente aos eventos climáticos extremos que se tornaram mais comuns nos últimos tempos.
A conclusão faz parte de estudo encomendado ao economista Claudio Frischtak, da consultoria Inter.B, pelo Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada – Infraestrutura (Sinicon), obtido com exclusividade pelo Estadão. A pesquisa mostra que, em 2024, o estoque de capital em infraestrutura (ou seja, o valor total da infraestrutura existente) em comparação com o Produto Interno Bruto (PIB) está em 35,5% no País, pior índice desde 2013. Esse número deveria estar acima de 60%, segundo pesquisas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Desde o início da série histórica analisada, começando em 1970, o melhor momento do estoque aconteceu durante a década de 1980, quando esse índice chegou a 53,4%, em 1983, patamar retomado em 1992. Desde então, o índice vem caindo gradativamente, com uma pequena recuperação entre 2014 e 2016.
O País tem dificuldades até para manter os investimentos necessários para fazer a manutenção adequada das malhas existentes. Entre 2022 e 2024, o investimento ao ano ficou abaixo de 1,9% do PIB. “A nossa infraestrutura é um pouco antiga, com uma idade média de 30 e 40 anos”, afirma Frischtak. “Infraestrutura não dura para sempre, e precisa ser substituída”, alerta o economista.
Os problemas vão além do volume de investimentos necessários para modernizar o setor. Segundo Claudio Frischtak, o Brasil investe mal e faz uma alocação inadequada dos recursos. “Há muito desperdício, inclusive, com projetos que fazem pouco sentido. Ou seja, o planejamento da expansão do setor é falho”, analisa.
Para o economista, esses projetos deveriam ser tratados como projetos de Estado, não de governo. “Não dá certo se cada governo tem o seu projeto, sem levar adiante um plano que deveria ser de décadas. Não é problema de um único governo, e também envolve Estados e municípios”, completa.
O estudo prevê que serão investidos, neste ano, R$ 212,7 bilhões, o equivalente a 1,85% do PIB. Desse valor, R$ 142 bilhões devem vir da iniciativa privada (1,23% do PIB) e R$ 70,7 bilhões de gastos públicos (0,61%).
“Podemos ficar num ciclo vicioso. Se o País não amplia a sua capacidade de arrecadação, não sobra dinheiro para investir. E, se não investe, ele não cresce. Temos de romper este ciclo”, diz o diretor-executivo do Sinicon, Humberto Rangel.
Questionado sobre a situação, o Ministério dos Transportes defende a retomada de mais investimentos públicos, com participação maior da iniciativa privada. “A agenda mais importante do que a de obras é a agenda das concessões públicas”, afirma o secretário executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro. “Na média dos últimos seis anos tivemos 1,5 concessão rodoviária por ano. Nos últimos 35 anos, foram 26 contratos de concessão. Queremos passar de 14 mil km de concessões de rodovias, no início do governo, para 30 mil km”, diz.
Transportes e saneamento são os setores mais preocupantes
Os setores com maior defasagem de investimentos desde 2001 são, pela ordem, os de transportes e de saneamento, que precisariam de mais do que o dobro do nível de investimentos anual do que a média do passado recente. Entre 2001 e 2004, a média anual de recursos para transportes ficou em 0,67% do PIB, quando o necessário deveria estar em 1,98%. Já em saneamento, no mesmo período, a média esteve em 0,19%, mas precisaria de 0,44% – com marco regulatório aprovado em 2020, o setor tenta recuperar o tempo perdido e vários leilões tem sido realizados.
Essa defasagem pode ser sentida com maior força em algumas regiões, diz Claudio Frischtak. Em transportes, diz ele, o País enfrenta “uma crise de mobilidade urbana em praticamente todas as regiões metropolitanas e em muitas cidades médias”. Em rodovias, a rede operada pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e por muitos Departamentos de Estradas de Rodagem estaduais (DER) se caracteriza por problemas de má qualidade e baixo investimento, com ênfase no Nordeste, e em Estados com maior fragilidade fiscal, como Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) indica que 67,5% das rodovias brasileiras tiveram, em 2023, sua extensão classificada como regular, ruim ou péssima, e 32,5% foi classificada como ótima ou boa.
A situação do hiato entre investimentos e o necessário para melhorar a infraestrutura é menor nos setores de energia e telecomunicações, mas também existe. Em energia, o investimento médio anual ficou, entre 2001 e 2024, em 0,63%, e deveria estar em 1,06%. A melhor situação está nas telecomunicações, setor que passou por privatização no fim da década de 1990. Entre 2001 e 2024, o investimento foi de 0,51% do PIB, e a necessidade seria de 0,71%. No primeiro semestre deste ano, o setor de telecomunicações investiu R$ 15,8 bilhões. O valor mantém uma estabilidade em relação aos valores do mesmo período de 2023.
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