Dilma disse que a gravação demonstra a necessidade de afastá-la do cargo para interromper as investigações da Lava Jato
Em sua segunda agenda pública depois
da abertura do processo de impeachment, a presidente afastada Dilma
Rousseff afirmou que as gravações envolvendo o agora ministro afastado
Romero Jucá deixam “evidente o caráter golpista e conspiratório que
caracteriza o processo de impeachment”. “Agora mais do que nunca está
claro o caráter golpista desse processo de impeachment”, afirmou na
abertura do IV Congresso Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na
Agricultura Familiar do Brasil, na capital federal.
Jucá solicitou nesta segunda, 23, o
afastamento de seu cargo, “até que sejam esclarecidas as informações
divulgadas pela imprensa”. A saída de Jucá foi consequência das
conversas gravadas e divulgadas pela Folha de S.Paulo, entre ele e o
ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em que Jucá supostamente
fala da tentativa de se barrar a Operação Lava Jato com o afastamento de
Dilma Rousseff da presidência da República.
Dilma disse que a gravação demonstra a
necessidade de afastá-la do cargo para interromper as investigações da
Lava Jato e que esse sempre foi o objetivo do grupo do vice-presidente
Michel Temer. “Se alguém ainda não tinha certeza de que há um golpe em
curso, baseado no desvio de poder, as informações de Jucá sobre reais
objetivos do impeachment eliminaram qualquer duvida”, afirmou.
A presidente afastada disse que o
caráter golpista ficou “escancarado” na gravação. “Agora um dos
principais articuladores (do impeachment) confessa que eles são
golpistas”, reforçou. Dilma cita ainda um trecho da conversa de Jucá em
que ele diz que o presidente interino é o presidente afastado da Câmara,
Eduardo Cunha. “É uma frase muita pesada”, diz. “Hoje, mesmo afastado
da presidência, Eduardo Cunha ainda dá as cartas” completou.
A presidente afastada voltou a citar a
dificuldades com o Congresso para aprovar medidas econômicas, disse que
ela quer que o País volte a crescer e que Cunha é o responsável por
impedir “sistematicamente” as comissões do Congresso de funcionarem.
“Quero destravar a economia.”
“O ex-presidente da Câmara impediu que
houvesse indicação para essas comissões e impediu também que tramitasse
pela Câmara qualquer medida que melhorasse a economia.”
Ao dizer que foi afastada
provisoriamente, Dilma disse que, em 2014, o Brasil reelegeu uma mulher
para executar um programa progressista e para montar um ministério “que
tivesse a cara e as cores do Brasil”. “Os brasileiros não elegeram um
governo só de homens, brancos, ricos e velhos”, afirmou.
Medidas do governo Temer
Dilma criticou o governo interno de
Temer, disse que em pouco mais de uma semana ele anunciou medidas que
contrariam programa que foi aprovado e teve, muitas vezes, que recuar em
decisões. “O presidente provisório não foi autorizado pelo povo a mexer
em programas sociais para diminuí-los. Ele não foi autorizado pelo
povo”, disse. “Ninguém deu a ele o direito de ser neoliberal na economia
e conservador em tudo mais.”
Aos agricultores familiares, Dilma
classificou a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário “como
uma das mais graves” e afirmou que é preciso desfazer as iniciativas do
governo interino. “Vamos ficar atentos para desfazer essas iniciativas
desse governo provisório e interino”, afirmou.
A presidente afastada afirmou ainda que o
governo Temer não conhece a realidade do campo brasileiro. “É
lamentável esse desprezo pela realidade rural, por esse desconhecimento
da realidade”, disse. “Nós temos memória e quem tem memória tem a
capacidade de lutar. Sabemos que são esses que não olham e não dão
importância à agricultura familiar”, completou.
Sem citar especificamente a retirada
pela polícia de manifestantes em frente a casa do Temer em São Paulo,
Dilma rechaçou a ideia de que os movimentos sociais devem ser
controlados e afirmou ser contrária a governos autoritários que acham
que é preciso tratar movimentos como “questão de polícia”. “Tenho muito
orgulho de jamais ter me relacionado com movimentos sociais de forma
autoritária e arbitrária”, disse.
Dilma disse ainda que tem “grande temor”
pelo que “eles” podem fazer. “Estamos enfrentando um governo ilegítimo
que em uma semana já fez muitas coisas de forma incorreta”, afirmou. No
fim do seu discurso, Dilma disse que continuará lutando em respeito ao
voto dos brasileiros. “Estarei nas ruas, nos campos e nas cidades, em
paz, mas firme em minhas convicções e clara no meu objetivo”, disse.
No evento, organizado pela Federação
Nacional do dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
(Fetraf), órgão ligado a CUT, a petista foi recebida aos gritos de
“Dilma, guerreira do povo brasileiro”. A secretária nacional de formação
CUT, Rosane Bertotti, fez um discurso dizendo que o governo “golpista
de Temer não me representa”. Ao entoar gritos de “Fora Temer”, do palco,
Dilma apenas sorria para a plateia.
Na sexta-feira, Dilma participou de um
evento com blogueiros em Belo Horizonte. Hoje, apesar de escolher também
um público que costuma ter poder de mobilização, o auditório no Parque
da Cidade, em Brasília, ficou com muitas cadeiras vazias ao fundo. Cerca
de 700 pessoas ouviram o discurso de Dilma.
A presidente afastada chegou acompanhada
dos ex-ministros Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário), Eleonora
Menicucci (Política para Mulheres) e Carlos Gabas (Aviação Civil).
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