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Delator teria gravado conversa em que senador do DEM cobrou propina R$ 1 milhão para a campanha
A palavra de três dos réus da Sinal Fechado e mais documentos de
movimentações bancárias feitas por George Olímpio não são as únicas
provas enviadas a Procuradoria-Geral da República, contra o senador José
Agripino, presidente nacional do DEM, por suposto envolvimento no
esquema denunciado na Operação Sinal Fechado. Há informações de que
George Olímpio teria também gravado o diálogo feito com o parlamentar no
dia em que ele cobrava a propina de R$ 1 milhão para manter a inspeção
veicular.
O áudio enviado para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
confirmaria o conteúdo do depoimento prestado por George Olímpio após
assinar a delação premiada com o Ministério Público do RN. Ou seja:
confirmaria que José Agripino cobrou R$ 1 milhão em doações para a
campanha dele, em 2010, quando foi reeleito senador da República.
O Ministério Público do RN – que reuniu os elementos (depoimento e
documentos) contra José Agripino e os enviou para a Procuradoria-Geral
da República, órgão responsável por investigar senadores, detentores de
foro privilegiado – não confirmou a existência desse áudio. Essa nova
prova teria sido enviada diretamente para a PGR, pelo réu, sem passar
pelo MPRN.
Em depoimento divulgado nesta semana pelo MPRN, George Olímpio conta
que foi procurado pelo ex-suplente de Agripino, João Faustino (que
faleceu em 2014), entre o final de agosto e o início de setembro de
2010. Faustino teria marcado mostrado pesquisas que davam a vantagem a
candidata do DEM, Rosalba Ciarlini, e sugerido que George agendasse uma
reunião com Agripino.
“Conversamos amenidades e tal e quando ele me apresenta a pesquisa eu
já caí na real que ali representa alguma coisa”, afirmou George Olímpio
no depoimento prestado ao MPRN, antecipando que sabia que a procura de
João Faustino representava o início da negociação para doação de
campanha.
Apesar de boa parte do depoimento de George Olímpio confirmar a
delação premiada de outro réu, Alcides Barbosa, e, consequentemente,
também de Gilmar da Montana, eles diferem em alguns momentos. “Aquele
negocio que Alcides falou de festa, de coquetel, aquilo ali não existiu.
Coquetel para tratar de propina, não existe. O que existe é o que estou
dizendo”, afirmou George.
Delator fez empréstimo para pagar propina a Agripino
De acordo com George Olímpio, Agripino cobrou R$ 1 milhão para ele,
porque o valor seria o mesmo doado para a campanha de Iberê Ferreira.
“Eu disse: ‘olhe, posso participar da campanha do senhor, mas estamos
num momento de muito aperto. A condição que a gente vai ter melhor é a
partir de 2011′. Aí ele: ‘E quanto é que você pode dar agora?’ Fiz uns
cálculos rápidos. Aí ele: ‘Então me arrume R$ 500 mil’. Aí eu: ‘olhe,
também não tenho condição de arrumar R$ 500 mil’. Aí eu disse ‘olhe,
tenho condição de arrumar já R$ 200 mil para o senhor’, porque para mim
aquilo foi um aviso muito claro que, ou você participa, ou você perde a
inspeção. Uma forma muito sutil, mas uma forma de chantagem”, relembrou.
O réu da Sinal Fechado afirmou que, em outra conversa com o senador,
conseguiu juntar R$ 300 mil para doar para ele e acertou que o restante,
os R$ 700 mil cobrados por Agripino, seria garantido por meio de
empréstimos (conforme sugestão do próprio senador) junto a Marcílio
Carrilho, presidente municipal do DEM, e Ximbica, empresário e que na
época era suplente de Agripino – seria substituído naquele ano por João
Faustino.
Com Carrilho, George Olímpio conseguiu R$ 400 mil e, com Ximbica, R$
300 mil. A dívida rendia juros de R$ 25 mil por mês e essa quantia era a
única que George Olímpio contou que conseguia pagar até fevereiro de
2011 – depois, com o cancelamento da licitação da Inspeção Veicular, nem
isso conseguiu.
A dívida foi então assumida por “ele”, José Agripino. “Eu só tinha
como pagar com a inspeção rodando. Eu não tinha como pagar sem isso. Mas
eu paguei os juros e os R$ 300 mil. Foram R$ 450 mil mais o nome
emprestado para esse dinheiro ir para ele”, relembrou George Olímpio.
Áudio de João Faustino confirma propina para Agripino
Um “direito certo”, mas que precisava do apoio do senador José
Agripino para ser validado. Era assim que o réu George Olímpio via a
inspeção veicular no Rio Grande do Norte ou, pelo menos, foi isso que
ele demonstrou em conversa gravada por ele com João Faustino, falecido
no ano passado. A gravação, entregue pelo réu ao processo, foi liberada
pelo Ministério Público do RN na tarde desta terça-feira, e reforça o
depoimento de George prestado após a delação premiada. Reforça, também,
os pagamentos feitos para a campanha do senador e da governadora do DEM,
que, aparentemente, eram de conhecimento de outros envolvidos, como
João Faustino e Carlos Augusto Rosado, marido de Rosalba Ciarlini.
Durante o dialogo, George Olímpio relembra a João Faustino o que foi
doado para a campanha do senador e pede que Agripino interfira no
entendimento do Executivo com relação à inspeção veicular. Segundo
George Olímpio, Agripino deveria ligar para o então procurador-geral do
Estado, Miguel Josino (falecido também no ano passado), e para a
governadora Rosalba Ciarlini, e dizer para eles entenderem a lei
aprovada na Assembleia Legislativa como “constitucional”.
Essa seria a “solução administrativa” proposta por George,
consequência do receio dele de ser julgado pelo Tribunal de Justiça,
mesmo tendo um “direto certo”. O réu, inclusive, ressalta o desejo de
levar o caso para julgamento na Justiça Federal – o que acabou não se
viabilizando e o processo seguiu no judiciário potiguar.
Relembra-se que essa é apenas uma das várias gravações feitas por
George Olímpio e entregues ao MPRN após a assinatura da delação
premiada, motivada, segundo ele, pela falta de apoio dos demais
envolvidos e o “arrependimento” por sua conduta.
Miguel Josino, por sinal, seria o principal obstáculo para a mudança
do entendimento dessa lei, por julgá-la inconstitucional. O
posicionamento do jurista é exposto por João Faustino em narrativa sobre
o encontro que ele teve com Carlos Augusto. “Ele lembra de tudo”,
afirma Faustino para tranquilizar George Olímpio e dizer que o marido de
Rosalba está ciente que foi ajudado durante a campanha pelo réu.
“(Lembra da) participação do consórcio na campanha e até uma
participação mensal depois da campanha”, afirma João Faustino, frisando
que Carlos Augusto até comentou: “Essa participação mensal, eu
dispenso”.
“Carlos Augusto sabe das negociações que Zé Agripino fez”
Dialogo gravado por George Olímpio com
João Faustino, na casa do suplente do senador. Na conversa, João
Faustino conta a George o diálogo que teve com Carlos Augusto Rosado,
marido da ex-governadora Rosalba Ciarlini, na época, recém empossada na
chefia do Executivo.
João Faustino: Ele (Carlos Augusto) diz que se lembra, sabe das negociações que Zé Agripino fez, sabe que você se comprometeu.
George Olímpio: Não e fora a negociação daquele dinheiro, tem uma parte que foi dada.
João Faustino: Eu sei…
George Olímpio: E mais 150 que… Eu não
lembro o nome daquele menino… Que eu dei uma parte por último. Zé
Agripino me pediu e eu dei 150. Um cheque, que ele pegou dinheiro
daquele rapaz, que fica lá na tevê, na Tropical.
João Faustino: Sei, sei, o sobrinho dele, Tarcísio.
George Olímpio: Tarcisinho, que vence em
setembro o cheque. Mais 150, no final. Na última semana da campanha ele
me chamou e disse: ‘George, eu preciso de você’
João Faustino: Você deu 200 mil?
George Olímpio: Eu dei 300.
João Faustino: Em dinheiro?
George Olímpio: Em dinheiro.
João Faustino: Aí depois?
George Olímpio: Marcílio deu R$ 400, Ximbica deu R$ 300
João Faustino: Aí mais 150…
George Olímpio: Aí na última semana ele me chamou e disse: ‘George, eu preciso de você’. Mais 150.
João Faustino: Fora os juros.
George Olímpio: Os juros eu já vou
pagando… Agora, em Brasília, ele me pediu para pagar o desse mês. Eu
chega fiquei destreinado. Mas tudo bem.
João Faustino: Eu passei para ele isso
aí… Carlos Augusto me chamou e disse: Olhe, o que faltou nisso aí foi
diálogo. Eu disse: Não, Carlos Augusto… (trecho não compreendido)…
Porque Paulo de Tarso ficou como representante do governo para abrir o
diálogo e o entendimento sobre esse assunto e George esteve com Paulo de
Tarso em dezembro. Fora eu e José Agripino tivemos várias vezes com
Paulo de Tarso. Esse não é o motivo. Arranje outro motivo. Ele disse:
‘Não o problema é que esse consórcio quis se fazer proprietário do
Estado. Ditar as normas do Estado’. Não houve isso, rapaz. Houve uma
licitação, eles ganharam. Depois… Eles foram contratados para iniciar o
serviço. Investiram. Gastaram 12 ou 15 milhões de reais. E o Estado tem
que assumir a responsabilidade por isso. Aí ele disse: ‘concordo, até
porque tem o problema da insegurança jurídica’. Eu digo: ‘É. Se você não
conseguir uma solução para isso, ninguém vai mais investir no Rio
Grande do Norte’.
…
João Faustino: Esse povo de Mossoró que está fazendo inspeção, quem é?
George Olímpio: Não. Não tem inspeção.
João Faustino: Não, tem inspeção!
George Olímpio: Não, não, não. Tem uma
lei que foi feita em Mossoró, mas não iniciaram nada. Eu sabia que essa
lei tava em tramitação para votar. Nem sabia que tinha sido votada. Só
que a resolução do CONAMA diz o seguinte: primeiro, só em municípios com
mais de 3 milhões de habitantes pode fazer. E mesmo esses acima de 3
milhões tem que seguir a orientação do Estado, se conveniando com
Estado. Por que? Porque quem regula isso é o Detran, que tem a base de
dados.
…
João Faustino: (falando ainda da
conversa com Carlos Augusto, o marido de Rosalba teria dito:) ‘Eu
proponho e me comprometo com você a estudar, a conversar com Miguel
Josino’. Agora diz que Miguel Josino é muito a favor da nulidade. A
única pessoa do âmbito jurídico que defende o procedimento é Paulo de
Tarso. É a única pessoa do ponto de vista jurídico que defende.
George Olímpio: Então não valeria,
depois dessa conversa, uma ligação do senador Zé Agripino para Miguel
Josino, nesse sentido: ‘Miguel, defenda a lei’?
João Faustino: É.
George Olímpio: Porque é um absurdo o
que se está dizendo da inconstitucionalidade, porque não é. Já existe um
julgado igual no STF. Como é que a procuradoria do Estado do RN vai
dizer que o STF está errado?
…
João Faustino: Eu vou falar com José Agripino…
George Olímpio: E dizer, olhe, existe
uma lei do Distrito Federal, que ‘ipsis litteris’ a lei da gente, quer
dizer, não tem cabimento o procurador-geral do Rio Grande do Norte dizer
que o STF está errado.
…
George Olímpio: O que a gente vai dizer é
que o CONAMA tem que ser ouvido. Que o CONTRAN tem que ser ouvido. E
que a esfera estadual é incompetente para julgar matéria…
João Faustino: Exatamente.
George Olímpio: Porque na Justiça
Federal eu acho que a gente tira dessa cúpula do Tribunal… Vai depender…
Quem é do Tribunal que vai ficar contra governo novo?
João Faustino: Ora, ninguém!
George Olímpio: Nem que se trabalhe… Nem
que José Agripino vá lá e diga: ‘faça por mim’. O que é que José
Agripino tem para dar para eles? Zero, em comparação com a governadora.
Eu estava racionando isso ontem à noite, com calma. Aqui não adianta a
gente…
…
George Olímpio: (na Justiça Federal) tem como se trabalhar lá em cima, de alguma maneira, através de…
João Faustino: Claro, claro. Na pior das hipóteses você terá um julgamento isento…
George Olímpio: O que é bom para mim,
porque meu direito é excelente. Mas ainda achou que existe essa
possibilidade de saída administrativa boa.
João Faustino: Mas lembre-se: vai
depender de Miguel Josino. Dessa conversa e de quem está conversando lá
dentro. E o cara sair de lá com a palavra de Miguel Josino, acertado,
está resolvido. As arestas de Carlos Augusto foram quebradas de alguma
forma. Não digo totalmente, mas de alguma forma.
George Olímpio: A governadora foi para Brasília hoje?
João Faustino: Não. Ela vai amanhã.
George Olímpio: E como é que Miguel vai
apresentar isso para ela amanhã, ele tava dizendo? Vai apresentar na
quinta então… Seria bom se o senador José Agripino desse uma palavra com
ela também. Nesse sentido: ‘existe essa possibilidade, a empresa não
desconsidera isso. Agora, tome a atitude de achar a lei legal,
constitucional, e vamos para o diálogo com eles, que até hoje não teve’.
João Faustino: Eu vou falar com ele, tranquilamente.
“Carlos Augusto só entende a linguagem dele. É um cafajeste”
O diálogo acima não é o único que foi
gravado com João Faustino. Em outro áudio disponibilizado pelo MPRN, os
dois conversam sobre a situação atual de George Olimpio. O réu,
considerado o principal articulador do esquema, revela que está
“quebrado” e quer pressionar Carlos Augusto Rosado para que o processo
da implantação veicular seja retomado no Estado.
“É o seguinte: Carlos Augusto só entende
a linguagem dele. É um cafajeste. Então, eu acho que a gente tem que
fazer da mesma maneira. O sujeito só tem medo do que lhe é exposto. Não
sei. (…) ‘o rapaz tem prova suficiente, ele nunca disse isso para a
gente, Carlos Augusto, mas ele está aí há ano. Se queixou que está muito
mal financeiramente para João Faustino’. Não sei. Temos que criar
alguma, porque estou vendo que juridicamente era um caminho tão bom, até
porque temos um direito bom, fechou-se por uma questão processual”,
afirma George Olímpio.
Repetindo diversas vezes que está no seu
“limite”, o réu volta a pedir a ajuda de José Agripino para intermediar
a conversa com Carlos Augusto e tentar retomar o processo. Contudo, até
para falar com o senador, George Olímpio teve que recorrer a João
Faustino, demonstrado que, aparentemente, já não era mais recebido pelo
democrata. “Se quiser marcar uma conversa com José Agripino, para abrir
meu coração para ele, eu acho que mereço. Eu nunca tive com ele depois
que realmente foi cancelado esse contrato. Acho que mereço um tratamento
mais, mais… Pontual. Eu realmente estou… Tinha todo um pensamento
jurídico, toda uma coisa para se fazer, e agora…”, pede George Olímpio.
MEMÓRIA
Segundo o Ministério Público do RN, o processo de inspeção veicular
no RN foi viabilizado graças a ação criminosa de um grupo encabeçada por
George Olímpio. O advogado teria pago o deputado estadual Ezequiel
Ferreira (PMDB) para ele acelerar a votação do projeto de lei que
instituía a inspeção no RN e, depois, ajudado financeiramente na
campanha de Rosalba Ciarlini e José Agripino.
Em outros áudios, George Olímpio afirma que doou R$ 1 milhão para a
campanha de Rosalba e outros R$ 1,1 milhão para a de José Agripino. Os
valores teriam sido pagos com o objetivo de fazer a inspeção viável
mesmo com a vitória da democrata na eleição daquele ano (em 2010).
George pagou, Rosalba venceu, Agripino venceu, o consórcio Inspar
(montado por George) ganhou a licitação para explorar a inspeção no RN,
mas o processo jamais foi implantado, graças a ação do MPRN, que
deflagrou ainda em 2011 a Operação Sinal Fechado, levando para a prisão
George, João Faustino e outros vários envolvidos.
Tendo que negar depoimentos de outros réus, como Alcides Barbosa,
feitos com delação premiada, George Olímpio teria se complicado no
processo e visto cada vez mais reduzidas suas chances de escapar da pena
elevada. Com isso, decidiu no ano passado, também, assinar a delação e
ajudar ao MPRN, dando um novo depoimento, entregando áudios e documentos
que comprovaria o recebimento de propina por parte de Agripino,
Ezequiel e outros.