O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), foi derrotado na
noite desta quarta-feira na tentativa de votar o projeto de Abuso de
Autoridade. Após ser alvo de várias críticas por parte da maioria das
lideranças da Casa, o senador recuou e decidiu encaminhar a proposta, de
sua autoria, para discussão na Comissão de Constituição e Justiça.
O revés de Renan no plenário ocorreu duas semanas depois de os
integrantes da Casa também rejeitarem votar “a toque de caixa” o pacote
anticorrupção, aprovado pelos deputados na madrugada do último dia 30 de
novembro.
Antes de colocar em votação o texto, Renan chegou a defender ao longo
do dia a necessidade de se aprovar as novas regras. “No que depender de
mim, vamos votar sim. Essa lei é muito importante para o Brasil… Se não
aprovar, saibam que não foi porque não trabalhei” afirmou.
Durante as discussões no plenário, o relator da proposta, senador
Roberto Requião (PMDB-PR), tentou angariar o apoio dos demais com o
discurso de que a iniciativa não tinha como alvo enfraquecer as
investigações da Operação Lava Jato.
“Não estamos fazendo uma lei especial, que seria uma lei de exceção
para os tempos de Lava Jato. A Lava Jato foi uma iniciativa
extraordinariamente eficaz dos promotores e dos juízes de primeira
instância da cidade de Curitiba… Contundo, esperamos que ela um dia
acabe, não porque acabou a corrupção, mas vai acabar porque os
investigadores, cedo ou tarde, voltarão ao leito normal dos inquéritos e
processos sem recursos espetaculosos da mídia”, ressaltou Requião.
As declarações dele tiveram respaldo apenas do líder do PT, Humberto
Costa (PE), e do senador Jader Barbalho, que também se posicionaram a
favor da aprovação da proposta. “Esse tema não é para regular a Operação
Lava Jato, mas para regular em todos os níveis o abuso de autoridade”,
afirmou o peemedebista.
Apesar das manifestações de alguns aliados, Renan percebeu que a
proposta não havia recebido o número de apoio necessário para que ela
fosse aprovada. De posse do relatório, a senador Simone Tebet (PMDB-MS)
afirmou que as novas regras poderiam ser utilizadas como um “abafa” às
investigações. “Do jeito que está tem cheiro de abafa da Lava Jato… Não
vou me servir do meu mandato para virar as costas para o povo
brasileiro. Eu li o projeto e ele não está maduro para ser votado”
ressaltou.
Um dos autores do requerimento pela retirada da proposta da pauta,
Randolfe Rodrigues (Rede-AP) considerou que o principal alvo do texto é
atingir o Ministério Público Federal. “Quem vai definir a subjetividade
do aceitável e do razoável na atuação de um promotor de justiça, de um
procurador da República, de um membro do Ministério Público? A
subjetividade vai acabar criminalizando o acusador”, afirmou. Diante do
isolamento no plenário, Renan anunciou que não colocaria o projeto em
votação e encaminharia para a Comissão.
Condenação. O projeto apresentado define os crimes
de abuso de autoridade cometidos por agente público, incluindo neste rol
servidores públicos e pessoas a eles equiparadas, além de membros do
Ministério Público e dos Poderes Judiciário e Legislativo de todas as
esferas da Administração Pública – federal, estadual, distrital e
municipal.
O texto estabelece, como efeito da condenação, a obrigação de
indenizar o dano causado pelo crime, devendo o juízo criminal fixar o
valor mínimo de reparação, considerando os prejuízos sofridos pelo
ofendido. No caso de reincidência, a condenação poderá ser a perda do
cargo, mandato ou função pública, independentemente da pena aplicada.
Entre as penas previstas também está a detenção, de até quatro anos, a
autoridade que decretar a condução coercitiva de testemunha ou
investigado manifestamente descabida ou sem prévia intimação de
comparecimento ao juízo. O projeto prevê ainda pena de até 2 anos ao
agente público que permitir fotografar ou filmar investigado, indiciado
ou vítima em processo penal, sem seu consentimento.
Manobra. Durante a tarde desta quarta-feira, Renan
tentou incluir no projeto uma medida para garantir ao peemedebista e a
demais detentores de foro privilegiado o direito a serem julgados em
ações de improbidade apenas por tribunais. Atualmente, esse tipo de ação
– mesmo para quem tem foro privilegiado – é julgada na primeira
instância por ter natureza cível. Esse direito seria obtido com a
incorporação de projeto de lei antigo já aprovado pela Câmara à proposta
atual.
O projeto de lei 65 de 1999 da Câmara que foi desarquivado nesta
quarta pela Secretaria Geral da Mesa do Senado prevê, além de punições
como prisão para juízes e promotores condenados por abuso de autoridade
por declarações sobre processos, a adoção do foro por prerrogativa de
função para casos de improbidade administrativa.
Isso significa que as ações penais iriam tramitar no Supremo Tribunal
Federal, foro em que Renan é alvo de investigações criminais, como o
processo em que ele é acusado de ter recebido propina da construtora
Mendes Júnior para apresentar emendas parlamentares que beneficiavam a
empreiteira.
A estratégia de Renan, que tem amparo regimental, consiste em apensar
essa proposta de 1999 ao projeto de abuso de autoridade, cujo autor é o
próprio peemedebista e é relatado pelo senador Roberto Requião.

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