LETÍCIA CASADO E RANIER
BRAGON - BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidenciável Jair Bolsonaro
(PSL) não informou até o momento à Justiça Eleitoral, de forma
discriminada, diversos gastos de sua campanha, incluindo os detalhes de
viagens que fez a pelo menos 16 cidades de 7 estados, onde ele, sua
comitiva e aliados participaram de carreatas e comícios em caminhões de
som.
A poucos dias do segundo turno, o candidato declarou pagamento a apenas
seis pessoas: o coordenador financeiro, dois auxiliares, dois seguranças
e a intérprete de libras.
Segundo dados da prestação de contas parcial ao TSE (Tribunal
Superior Eleitoral), Bolsonaro informou, até agora, custo de R$ 955 mil
na campanha do primeiro turno, excluídas doações a outros candidatos.
Por
lei, toda a movimentação financeira dos candidatos feita até 8 de
setembro -o grosso da campanha de Bolsonaro ocorreu antes disso, já que
ele sofreu um ataque a faca no dia 6 de setembro– deve ser informada de
forma discriminada à Justiça Eleitoral, para divulgação na internet.
A declaração de gastos entregue pelo candidato do PSL é bem inferior ao da maior parte das outras campanhas presidenciais.
As contas do capitão reformado somam 27 itens de gasto (R$ 843 mil) até o dia em que sofreu o atentado.
Os
maiores valores são R$ 285 mil para uma agência de viagens, locação de
veículos e hospedagem, a Pontestur, R$ 135 mil para a Mosqueteiro
Filmes, empresa de produção dos programas de TV e rádio, e R$ 115 mil
para a AM4 Brasil Inteligência Digital, de serviços da internet.
Além
da ausência do detalhamento do custo das viagens, não há informação
sobre aquisição de suprimento para os dois comitês de campanha cedidos
pelo PSL.
A reportagem enviou perguntas detalhadas aos principais
advogados responsáveis pela campanha de Bolsonaro e à assessoria do
candidato no início da tarde desta segunda-feira (22). Voltou a insistir
nesta terça-feira (23). Não houve resposta.
A campanha de João
Amoêdo (Novo), por exemplo, também com tempo de propaganda similar,
listou 200 itens até 6 de setembro, em um total de R$ 2 milhões de
gastos -incluindo compra de suprimentos como papel higiênico, toalha,
locação de máquina de café expresso, lâmpadas e plástico bolha.
Adversário
de Bolsonaro neste segundo turno, a campanha do PT -com Lula, depois
substituído por Fernando Haddad- listou 311 itens de gasto, com R$ 19,1
milhões de custo declarado no mesmo período.
Entre o começo
oficial da campanha, em 16 de agosto, e o atentado que o levou ao
hospital, a reportagem identificou nas viagens de Bolsonaro um padrão:
carreatas, comícios, usos de caminhões de som e entrevistas coletivas em
hotéis em praticamente todas as cidades que visitou.
Não há,
porém, discriminação sobre quem pagou ou quanto custou o transporte
aéreo ou terrestre, gasolina, hospedagem, alimentos, água, suprimentos,
aluguel de salões de hotéis, caminhões de som e demais equipamentos dos
comícios e carreatas.
Bolsonaro começou a campanha em São Paulo,
em 17 de agosto. No dia seguinte, foi à Academia Militar das Agulhas
Negras, em Resende (RJ).
De 22 a 25 de agosto, percorreu o interior paulista: Presidente Prudente, Araçatuba, Glicério, São José do Rio Preto e Barretos.
No dia 27 de agosto, já estava de volta ao Rio de Janeiro, onde mora,
e no dia 29 foi ao Rio Grande do Sul. Em 31 de agosto, viajou a
Rondônia e no dia seguinte, seguiu para o Acre.
Em 3 de setembro fez campanha no Rio, depois no Distrito Federal e, por fim, em Juiz de Fora (MG), onde sofreu o atentado.
Há no site do TSE apenas o dado genérico do pagamento dos R$ 285 mil à empresa Pontestur.
A
reportagem fez perguntas por telefone a um dos responsáveis pelo grupo,
Luís Pontes, que concordou em ligar de volta com as respostas, mas isso
não ocorreu até o meio-dia.
O capitão reformado e seus aliados
também afirmaram várias vezes ter amplo apoio voluntário, mas a lei
(artigo 61 da resolução do TSE 23.553/2018) exige que todo trabalho de
campanha, remunerado ou não, seja informado e divulgado na internet.
O
valor, que entra na prestação como doação ao candidato, tem que ser
calculado "mediante a comprovação dos preços habitualmente praticados
pelo doador e a sua adequação aos praticados no mercado, com indicação
da fonte de avaliação".
O valor do trabalho voluntário à campanha
tem que estar dentro do limite de 10% da renda da pessoa. Caso
ultrapasse, ela pode ser multada.
Bolsonaro, que é deputado federal e presta contas eleitorais há cerca
de 30 anos, informou até agora ter apenas dois voluntários em sua
campanha, seu braço direito e presidente do PSL, Gustavo Bebianno (cujo
trabalho foi estimado em R$ 10 mil), e um auxiliar.
Ficam de fora,
por exemplo, a mulher de Bebbiano, Renata, que coordena a agenda de
compromissos do presidenciável e atua na interlocução com a imprensa, e
um dos principais advogados da campanha, Tiago Ayres.
Depois do resultado do primeiro turno, em 7 de outubro, a campanha alterou a forma de prestar contas.
Ela
informou detalhadamente o custo da entrevista coletiva no hotel
Windsor, no Rio -R$ 43 mil, com descrição do valor do aluguel do salão
(R$ 5.300), número de recepcionistas (7) e coordenadores de eventos
(32), além do material usado: 88 grades de contenção, 4 detectores de
metal, 20 rádios de comunicação e 1.500 pulseiras de acessos, entre
outros itens.
A lei eleitoral (9.504/97), ratificada pela
resolução 23.553/2018 do TSE, obriga -em seu artigo 50, inciso II- todos
os candidatos a informar à Justiça até 13 de setembro, de forma
discriminada, a movimentação de receitas e gastos de sua campanha
realizadas até 8 de setembro.
O parágrafo sexto do mesmo artigo
estabelece que "a não apresentação tempestiva da prestação de contas
parcial ou a sua entrega de forma que não corresponda à efetiva
movimentação de recursos pode caracterizar infração grave, a ser apurada
na oportunidade do julgamento da prestação de contas final.
No
caso de desaprovação, as contas são encaminhadas ao Ministério Público
Eleitoral para avaliar a proposição de ação de investigação judicial,
questionando se houve abuso de poder econômico ou político.
Se as
contas de um candidato são aprovadas com ressalva, o plenário do TSE
pode decidir encaminhar o caso para o Ministério Público.
Independentemente disso, o procurador ou algum partido político pode
pedir abertura de investigação judicial eleitoral.
Por estar
participando do segundo turno das eleições, Bolsonaro tem até 17 de
novembro para entregar as prestação final de contas (artigo 52),
"apresentando a movimentação financeira referente aos dois turnos".
Apesar da lei, tribunais consideraram até eleições passadas que
omissões na prestação parcial, quando são sanadas, representam falhas
formais não suficientes para rejeição das contas.
Em julgamentos
recentes, porém, ministros do TSE, entre eles o ex-presidente da corte,
Gilmar Mendes, manifestaram a necessidade de rediscutir essa postura a
partir das eleições de 2018, sob risco de tornar inócua a exigência de
prestação de contas parcial.
Em abril deste ano, o
vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques, assinou parecer no
qual afirma que a apresentação da prestação de contas parcial não pode
ser "considerada vício meramente formal, ainda que declaradas as
receitas e despesas na prestação de contas final".
"A tese
jurídica que confere caráter meramente formal à regra que impõe aos
candidatos e partidos a prestação de contas parcial subtrai
completamente sua força normativa e sinaliza para os destinatários da
obrigação a desnecessidade de seu cumprimento", escreveu o procurador.
Entre
as perguntas enviadas pela reportagem à campanha de Bolsonaro estão o
motivo de não ter havido discriminação dos gastos com viagens e do
pessoal que efetivamente trabalha na campanha.
A única resposta
dada foi da assessoria do escritório de Karina Kufa, que afirmou que "as
informações em relação à prestação de contas serão fornecidas dentro do
prazo legal, qual seja, 17.11".
A reportagem questionou por que não houve cumprimento do prazo em relação à prestação de contas parcial. Não houve resposta.
Como Bolsonaro declarou despesas e o que diz a lei eleitoral
Pessoal
Bolsonaro
declarou gasto relativo a apenas seis pessoas. Qualquer prestação de
serviço ou participação na campanha, mesmo que voluntária e gratuita,
deve ser declarada pelo candidato beneficiado. O valor financeiro deve
ser estimado, tendo como base parâmetros de mercado
Eventos
No
primeiro turno, Bolsonaro e sua equipe visitaram ao menos 16 cidades de
7 estados, locais onde participou de comícios em caminhões de som, deu
entrevistas em hotéis e participou de encontros. A prestação de contas
tem que ser detalhada e discriminada, item a item. A campanha fez uma
declaração genérica de contratação de uma agência de viagens, ao custo
de R$ 250 mil, mais R$ 35 mil de custo estimado com passagens aéreas
Conselheiros
Desde
a pré-campanha Paulo Guedes e outros economistas auxiliam Bolsonaro na
formulação do programa de governo e em preparativos para entrevistas e
debates. Um grupo de militares e aliados também se reúne periodicamente
em hotel de Brasília para discutir propostas. Técnicos em legislação
eleitoral se dividem sobre a necessidade de declaração, mas, em regra
geral, toda ação vinculada a campanha deve ser declarada, com custo real
ou custo estimado
Agenda e imprensa
A mulher do presidente
do PSL, Gustavo Bebbiano, coordena a agenda de Bolsonaro e atua também
na interlocução com a imprensa. Não há declaração sobre esse serviço e
seu custo. Qualquer prestação de serviço ou participação na campanha,
mesmo que voluntária e gratuita, deve ser declarada pelo candidato
beneficiado. O valor financeiro deve ser estimado, tendo como base
parâmetros de mercado
Alimentação e suprimentos
Não há
nenhum gasto específico declarado pela campanha com alimentação e
suprimentos. Todo gasto resultante de atividades de campanha deve ser
declarado pelo candidato. A campanha de João Amoedo (Novo), por exemplo,
declarou gastos com toalha, papel higiênico, locação de máquina de café
expresso, lâmpadas e kit de plástico bolha, entre outros
Área jurídica
Um
dos principais responsáveis pela área jurídica da campanha é o advogado
Tiago Ayres. Não aparece gasto relativo a ele na prestação de contas
Com informações da Folhapress.

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