Margareth Grilo - repórter especial/Tribuna do norte
Nesses
meses de estiagem, em áreas de grandes mananciais de água, a pesca tem
sido o meio de sobrevivência do sertanejo. As águas da barragem Armando
Ribeiro Gonçalves, dentro do município de São Rafael, atraem pescadores
vindos de longe, de cidades como Jucurutu e até mesmo Assu. Eles chegam
cedo, por volta das 4h e navegam, até águas profundas, onde os peixes
costumam 'se esconder' na estiagem, quando o volume dos reservatórios
cai.
Francisco
de Assis Sousa da Fé, 49 anos, não perdeu as esperanças. Vem de Assu,
de tempos em tempos, para pescar na barragem. No lugar onde vive, a
terra árida não é agricultável e a da Lagoa do Piató, que recebe águas
principalmente do Rio Piranhas/Assu e já esteve seca aproximadamente 50
anos, vindo a encher novamente depois que o canal fora desobstruído nos
idos de 1972, voltou a secar. "Tem pouca água. A lagoa não está dando
nada", contou o pescador.
Quando se desloca para São Rafael,
junto com outros pescadores, chega a passar uma temporada de até 25
dias. E, nem sempre, o resultado da pesca é bom. No dia em que
encontramos os pescadores, eles estavam quase encerrando a jornada (de
segunda até a quinta-feira tinham pescado 58 quilos de peixe). Em outras
temporadas, de cheia da barragem, chegam a sair com o dobro.
"A
estiagem está atrapalhando muito. No ano passado, que choveu muito, a
gente via peixe em todos os cantos e até na margem da barragem. Hoje não
se vê mais", contou José Rodrigues da Silva, o "Zé Oliveira". Quando a
equipe da TN chegou à barragem, próximo ao Clube Naútico, ele saía para
mais um dia de pesca. Apesar da escassez, mantinha a fé. "Ainda dá pra
tirar algum, mas precisa ir nas águas mais profundas, de seis, sete
metros", acrescenta.
Ele disse que antes chegava a sair da água
com até 100 quilos. Hoje, sai com, no máximo, 40 quilos, para dividir
por dois. Ele e o colega de pescaria. "Às vezes, a gente sai com 15
quilos, não é nada", citou. Francisco Jerônimo, 50 anos, conta que o
vento está "ruim demais, muito forte e atrapalha". "Uns dias tem pesca
boa, outros a gente sai sem nada e fica difícil pela despesa que a
gente, que vem de fora, tem com feira, gelo e combustível", disse o
pescador que se deslocou de Assu a São Rafael.
Na barragem, a
pesca é feita com rede. Poucos arriscam a pesca de anzol. José das
Graças Barbosa, 63 anos, é um deles. Entrou na água às 6h e saiu às
9h10, sem nenhum peixe. "Ontem peguei dois peixes de dois quilos e meio.
Está muito escassa a safra", mencionou. Fagner Brás, 18, pesca com rede
e teve mais sorte. Saiu do barragem com mais de 20 quilos em dois dias
de pescaria das 5h às 11h.
A Colônia de Pescadores Z-27 (São
Rafael) tem 1.200 pescadores, mas segundo a tesoureira da entidade,
Claudiomar da Silva Moura Soares, a barragem atrai pescadores até mesmo
de outros estados, como a Paraíba. "Nesse período de seca, muitos estão
se deslocando para onde tem mais água para ver se consegue algum
sustento na pesca", contou. A barragem é rica em tilápia. Outras
espécies, como curimatã e tucunaré desaparecem nos períodos de estiagem.
"O curimatã foi visto até meados de abril, agora está escasso",
disse Zé Oliveira, que pesca há 48 anos. Nas águas do açude Dourado, em
Currais Novos, apesar da reserva hídrica estar abaixo de 40%, as águas
continuam sendo visitadas por pescadores, mas a poluição e o baixo
volume têm provocado a mortandade de peixe. No açude Caiçarinha do
Carneiro, onde o volume d'água não representa 10% da capacidade, os
peixes também não resistem e morrem.
Apicultura sofre com a estiagem e cai produção
Diversificar
atividades tem sido uma solução, no semi-árido, pelo menos, para
alguns. Na zona rural de Jucurutu, o apicultor Francisco Canindé de
Morais, 53 anos, tirou perto de 200 litros de mel, de 18 colméias. Mas
parou a extração, quando a estiagem apertou. Segundo ele, por ano, dá
para tirar, por colméia, 80 litros. Com a estiagem, a apicultura sofreu
um baque. As colméias encheram em fevereiro, quando o marmeleiro e o
velame floresceram.
"Tirei um pouco de mel, mas o que tem lá não
posso mexer, porque senão elas vão migrar para outras regiões", citou o
apicultor. Canindé contou que vendia mel para Currais Novos, mas este
ano não fez venda pela baixa quantidade que extraiu. O que extraiu foi
suficiente para atender a demanda da Prefeitura. O mel, embalado em
saquinhos, é incluindo na merenda escolar.
"Em ano bom", disse
ele, "dá pra tirar uns R$ 4 mil, mas esse ano só tirei uns R$ 1 mil, mas
ainda tenho mel em estoque", contou. Normalmente, a colheita é feita a
cada 10 dias.
Em Santa Cruz é a avicultura que está em expansão.
Por aviário, a média de criação chega a 15 mil aves. Mas nessa época, a
estiagem exige mais investimentos, com sistemas de ventilação e
nebulização, para evitar a asfixia das aves.
Em alguns aviários,
mais de 10 mil litros de água são pulverizados. Nos últimos meses, o
cuidado foi redobrado nos aviários com frangos depois que uma queda de
energia provocou, em abril, a asfixia de quase 6.200 aves, na região. Os
avicultores amargaram um prejuízo de R$ 15 mil. As mortes foram
registradas em dois dias. "Com o clima muito quente e sem o suporte da
energia, não tivemos como fazer ventilação e nebulização", contou o
técnico em agropecuária, Paulo Rogério Araújo Cardoso.
Cerâmica é uma das opções na região
Se
para o agricultor, o sol causticante do sertão é um tormento, para a
indústria da cerâmica ele até ajuda. Com a temperatura mais quente, o
tempo de secagem dos tijolos e telhas é menor e a produção aumenta. Mas,
nem por isso, a atividade vai bem. Marcos Soares investiu no ramo da
cerâmica, nos arredores de Jucurutu. Atualmente, a cerâmica Santa Rita
emprega 20 pessoas. Este ano, ele abriu apenas cinco novas vagas, pouco
para a região.
Localizada a 19 km da sede do município, a
cerâmica está produzindo, em média, 90 milheiros de tijolos, por semana,
o dobro do que produz durante o inverno. Mas as vendas despencaram,
devido à crise econômica provocada pela estiagem, agravada em abril.
Segundo
o ceramista Marcos Soares o 'tempo é ruim, mesmo com a produção mais
alta'. "Da produção não tem o que reclamar. Está boa, mas tem mês",
disse ele, "que fabricamos 240 mil peças e não conseguimos vender tudo".
Marcos estima que as vendas registraram uma queda em torno de 50% e
acredita que, persistindo a crise econômica, a tendência é que os
ceramistas menores se desfaçam de seus negócios e com prejuízo.
Nas
cidades, a crise econômica gerada pela estiagem tem grande repercussão.
No comércio e nas feiras livres, as vendas caíram. Os comerciantes
sentem o declínio na pele. Nos armazéns, a procura pela ração está
diminuindo. "Hoje, o produtor", disse o comerciante Weber Joaci de
Araújo Mendes, de Currais Novos, "não tem poder aquisitivo, capital para
comprar".
Negócios rentáveis no semi-árido têm sido a venda de
palma e de água. Na estiagem, o caro-pipa inflaciona a seca,
principalmente onde a ação governamental não chega. O preço cobrado
pelos 'pipeiros' vai de R$ 60,00 a até R$150,00, dependendo da distância
que o pipeiro vai percorrer. A carrada da palma, que era vendida a R$
120,00 está a R$ 240,00.
Nenhum comentário:
Postar um comentário