Nos três dias em que esteve em Pequim, além da experiência de
passar em revista as estrelas vermelhas do uniforme do Exército de
Libertação Popular, o presidente mais “anticomunista” da história
recente do Brasil circulou dentro de uma das principais peças de
propaganda do governo do gigante asiático.
Produzido pela estatal First Automobile Works (FAW), mais antiga
montadora de veículos do país, o Hongqi L5 tem ar vintage porque remete
ao modelo mais icônico da marca, criado em 1958 para fazer frente às
limusines Rolls-Royce e Bentley exibidas em filmes de Hollywood e se
tornar símbolo de prosperidade e do alto escalão do Partido Comunista
chinês.
Chamado de CA770, o modelo foi usado por Mao Tse Tung, em 1972, na
lendária recepção ao então presidente americano Richard Nixon, em
Pequim. A visita é um marco histórico porque resultou no
reestabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países após 25
anos de isolamento.
O CA770 deixou de ser produzido em 1981 e, desde 2013, o L5 o
substitui como ferramenta importante de ostentação do poder chinês
frente aos luxos das principais potências capitalistas ocidentais.
Seda, ouro e jade
Foi a bordo do Hongqi L5 que Bolsonaro foi e voltou para a Praça da
Paz Celestial, onde foi recebido com as mais altas honras de Estado pelo
presidente chinês; para o seminário de negócios Brasil-China, que abriu
convidando investidores chineses para o megaleilão do pré-sal; e para a
Muralha da China, onde caminhou e tirou fotos com turistas.
Em chinês, Hongqi significa Bandeira Vermelha — o símbolo maior do
comunismo. Hoje, o modelo usado por Bolsonaro é o carro oficial de Xi
JinPing, que acumula as funções de líder maior do Partido Comunista
Chinês, chefe do Exército e presidente do país.
É também o veículo de passeio mais caro à venda na China: custa 850
libras esterlinas, ou 4,3 milhões de reais. O preço reflete a ostentação
encontrada dentro e fora do veículo.
No exterior, a principal marca do carro é uma escultura metálica
vermelha em formato de bandeira estendida no capô, entre os faróis (no
mesmo local em que a Mercedes, por exemplo, coloca sua tradicional
estrela). Os pisca-piscas nas laterais do carro têm o mesmo formato.
Forrada de couro, madeira e seda chinesa, a cabine tem pedras preciosas nas maçanetas das quatro portas.
Segundo a empresa, estas pedras de jade têm linhas que formam a
imagem de “nuvem e dragão”, simbolizando “identidade e virtude”. Elas
são esculpidas seguindo a proporção áurea.
Além de ostentar girassóis de ouro no volante e nas rodas, o carro
tem encostos de cabeça nos bancos desenhados a partir do formato dos
chapéus usados pela antiga dinastia Tang, que governou a China do ano
618 ao ano 907.
Os bancos onde Bolsonaro se sentou na limusine chinesa têm função
massagem e podem ser aquecidos ou resfriados, ao gosto do freguês —
normalmente, apenas autoridades chinesas ou Chefes de Estado com
relações políticas ou econômicas relevantes como a China, como é o caso
do Brasil, cujas trocas comerciais com o país chegaram a 100 bilhões de
dólares no ano passado.
“Não parece certo sentar em um carro estrangeiro”
O primeiro presidente estrangeiro a circular pela China a bordo de um
Hongqi L5 foi o ex-presidente francês François Hollande, em abril de
2013, durante uma visita oficial ao país para concretizar a venda de 60
airbuses para os chineses.
Em 2012, segundo jornais chineses, Xi Jinping disse, em discurso na
sede do Partido Comunista, que autoridades da China devem usar limusines
chinesas.
Depois de ter sido visto no exterior a bordo de Cadillacs e Mercedes,
Xi Jinping passou a levar Hongqi para usar em suas visitas. A primeira
vez foi na Nova Zelândia, em 2014. Pouco antes da visita de Bolsonaro,
em 12 de outubro deste ano, Xi JinPing foi à Índia e também levou a
limusine chinesa.
“Não parece certo sentar em um carro estrangeiro”, disse o presidente, segundo reportagem do South China Morning Post.
“Muitos líderes estrangeiros usam limusines feitas em seus próprios países, a não ser que eles não as tenham.”
Pesando mais de 3 toneladas, com 5,5 metros de comprimento e pouco
mais de 2 metros de largura, o carro é capaz de acelerar de 0 a 100
quilômetros por hora em 8 segundos.
A velocidade máxima, segundo a montadora, é de 210 quilômetros —
muito mais do que a comitiva de Bolsonaro foi capaz de chegar em meio ao
trânsito caótico de Pequim nos três dias de visita oficial.
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