O governo do Chile convocou nesta segunda-feira (29/08) o embaixador do Brasil em Santiago, Paulo Soares Pacheco, em protesto contra uma declaração do presidente Jair Bolsonaro sobre o líder chileno, Gabriel Boric, na véspera.
Durante o primeiro debate televisivo entre os candidatos à Presidência no domingo, Bolsonaro acusou Boric de incendiar metrôs durante os protestos de 2019 no Chile.
A fala veio durante as considerações finais do presidente no debate, que foi organizado pelo jornal Folha de S. Paulo, o portal UOL e as emissoras Bandeirantes e Cultura. Assim como seus adversários, Bolsonaro tinha dois minutos para fazer suas últimas declarações.
Em vez de promover suas propostas de governo, o candidato à reeleição usou o tempo para listar alguns líderes latino-americanos que teriam ligações com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas de intenção de voto ao Planalto.
"Quem o ex-presidiário apoiou no passado? Apoiou o [Hugo] Chávez, apoiou o [Nicolás] Maduro", disse Bolsonaro. "Lula apoiou o presidente do Chile também. O mesmo que praticava atos de tocar fogo em metrôs lá no Chile. Para onde está indo o nosso Chile?"
A declaração provocou repúdio no governo chileno, que negou as acusações contra Boric e enviou uma citação ao embaixador brasileiro, informou o jornal chileno La Tercera. Na diplomacia, convocar um embaixador para esclarecimentos é um jeito simbólico de demonstrar descontentamento.
"A desinformação corrói a democracia"
"Quero declarar diante das afirmações do presidente Bolsonaro do Brasil, ontem em um debate eleitoral, em que ele acusou diretamente o presidente Gabriel Boric de ter queimado o metrô: como governo, consideramos tais declarações gravíssimas, obviamente são absolutamente falsas", disse a ministra chilena das Relações Exteriores, Antonia Urrejola, citada pelo jornal.
Ela acrescentou que o governo em Santiago lamenta que, "em um contexto eleitoral, se aproveitem e polarizem as relações bilaterais através da desinformação e das notícias falsas".
"A desinformação e as notícias falsas corroem a democracia, mas também nesse caso corroem a relação bilateral. Estamos absolutamente convencidos de que essa não é a forma de fazer política", completou Urrejola.
Em comunicado à imprensa, o Ministério das Relações Exteriores do Chile disse ainda que as declarações de Bolsonaro "são inaceitáveis e não condizem com o tratamento respeitoso que se devem os chefes de Estado, nem com as relações fraternas entre dois países latino-americanos".
Apesar de tudo, a ministra ressaltou que "a relação com o Brasil, um povo irmão, com uma história comum, com desafios comuns, deve continuar se fortalecendo, e esperamos continuar enfrentando os desafios como povos irmãos que somos, para além dessas declarações".
Hostilidades de Bolsonaro
Segundo o La Tercera, a reação do governo chileno veio após conversas entre Urrejola e o presidente Boric a fim de encontrar uma saída que lhes permitisse confrontar as declarações de Bolsonaro, especialmente em meio à relação tensa entre os dois países desde a posse do chefe de Estado chileno, um ex-líder estudantil de esquerda, em março.
Segundo o governo do Chile, a hostilidade de Bolsonaro vai além de suas declarações polêmicas. Mais de cinco meses após Santiago ter indicado o nome de Sebastián Depolo para embaixador no Brasil, a proposta ainda não foi respondida pelo governo brasileiro. O gesto, segundo o La Tercera, foi interpretado a nível diplomático como uma recusa do líder brasileiro.
Assim, a mais recente acusação de Bolsonaro contra Boric foi considerada pelo governo chileno uma nova afronta ao país, e tanto a chanceler quanto o presidente entenderam que era preciso "elevar o tom" e dar um sinal mais concreto, escreveu o jornal.
Não é a primeira vez que Bolsonaro ataca o governo do Chile, usando o país como exemplo para criticar governos vizinhos de esquerda. Em 18 de agosto, durante um ato de campanha no interior de São Paulo, ele proferiu uma fala semelhante: "Olha para onde estão indo esses países. Olha o nosso Chile para onde está indo. Vocês querem isso para o Brasil?"
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